domingo, 15 de julho de 2012

Fabulas Temporis

Fabula Temporis














Fabula Temporis

Capítulo 1 – Bela Idéia, .

Sabe naqueles desenhos animados, quando acontece algo da pesada e o queixo do personagem cai?

Então, nunca achei que isso acontecesse na vida real.

Mas acontece. Puxa, acontece sim.

Sei disso porque era exatamente assim que eu estava, com o queixo no pé, enquanto Dumbledore falava comigo.

Como se eu ainda estivesse ouvindo alguma coisa.

Ok, vou contar como foi.

Acontece que eu pertenço a uma organização, a Armée de la Lumiére, que é como uma Ordem da Fênix, só que francesa. O nosso, hã, "líder" é Desiré Depardieu (que, juro pra você, é um homem), que trabalha no Ministério da Magia da França, é um auror de arrasar e amigo bem próximo de Dumbledore. Então nós ajudamos a Ordem sempre que possível, assim como ela nos ajuda.

Sendo assim, compartilhávamos o mesmo puro e genuíno desespero de ver o Voldemort botar o mundo para quebrar. Ele já tinha reunido um exército olímpico e nós já tínhamos a perfeita noção de que estávamos bem perto de perder a guerra.

Foi aí que eu tive a idéia.

Eu apenas pensei "puxa, se não podemos acabar com a raça de Voldemort agora, quem sabe não podemos voltar à época em que ele ainda era, hm, mortal para chutar o seu traseiro?"

Mandei uma carta para Desiré contando minha idéia pra lá de genial, e no momento seguinte ele já estava em Beauxbatons com Dumbledore.

Puxa, posso ser um membro 'júnior', mas sou tão boa quanto os outros, então minhas idéias são igualmente levadas a sério.

- É arriscado... – murmurava o Sr. D, que andava pela sala em círculos, apertando os lábios com as mãos, fazendo com que ele parecesse mais peixudo do que nunca. Quero dizer, com aqueles olhos esbugalhados e tudo o mais. Talvez ele goste de parecer um peixe. É um animal muito incompreendido, em minha opinião. Tenho certeza que ele possui muitos truques e utilidades, ainda desconhecidos pelo ser humano. Eu me orgulho do Sr. D por admitir sua identidade peixosa.

- Arriscado, porém possível e pode dar certo – Disse Dumbledore, naquela voz calma, fazendo com que eu parasse de admirar a semelhança do Sr. D à um peixe.

- É claro que pode, é genial – Eu disse, fazendo cachinhos na ponta de uma mecha do meu cabelo castanho quase-preto.

- Mas não consigo pensar em uma maneira de tornar isso possível – comentou o Sr. D, largando a boca, fazendo com que ele se parecesse um pouquinho menos com o Nemo – Poderíamos usar um Vira-tempo, mas não creio que ele conseguirá mandar alguém para um passado assim tão distante.

Dumbledore não respondeu, apenas se aproximou da mesa de Madame Maxime, que não se encontrava em sua sala no momento (era uma reunião particular – apenas eu, Dumbledore e o Sr. D - amo repetir isso), e conjurou um livro velho e nojento. Eu, que estava preguiçosamente sentada na imensa cadeira da diretora, cheguei um pouco para frente para ler o título do livro.

"O tempo perguntou para o tempo quanto tempo o tempo tem"

Puxa, as pessoas realmente deveriam pensar melhor antes de nomear suas obras literárias.

- É um livro muito teórico, poucas das teorias citadas nele foram realmente testadas, mas estamos em uma situação crítica e acho que vale a pena tentar – disse Dumbledore, folheando as páginas empoeiradas do livro, fazendo com que uma fumaça de poeira viesse diretamente na minha cara – Aqui está! – exclamou, parando em uma das páginas.

Depardieu parou de rodar e se aproximou da mesa, e virou o livro em sua direção, para ler o que Dumbledore indicava (o que foi muito egoísta da parte dele, pois o livro ficou de cabeça para baixo para mim). Seus olhos passavam rapidamente entre as frases, e assim que ele terminou de ler, voltou a apertar os lábios e a andar em círculos.

Virei, então, o livro para mim.

"Chaves de portal – Podem nos levar mais longe do que imaginamos.
As Chaves de Portal sempre foram utilizadas como maneira de transporte. Entretanto, o que poucos sabem, é que elas também podem ser úteis para transporte no tempo.
É claro que viagem no tempo é e sempre foi algo extremamente perigoso e complicado, e essa técnica não foge à regra.
Basta pegar um Vira-tempo e fundi-lo a uma Chave do Portal que leve ao local que você deseja estar quando chegar ao passado, utilizando o feitiço Confundo. Após, deve-se realizar o feitiço Tergum Temporis, não esquecendo de especificar o ano para qual deseja se transportar.
É uma técnica argilosa, que não possui resultados exatos, e não indicada para mais de uma pessoa. Caso duas pessoas tentem se deslocar para o mesmo ano, existem grandes chances de alteração genética (mutação).
Para voltar ao tempo presente, deve-se utilizar a mesma Chave do Portal fundida ao Vira-tempo, porém desta vez fazendo o uso do feitiço Protinus Temporis, técnica também inexata."

Terminei de ler sentindo uma enorme, enorme pena de quem quer que fosse que teria que fazer aquilo.

- Achei aceitável, e vocês? – perguntei.

- É a forma menos perigosa... – murmurou Dumbledore – Esses dois feitiços, Tergum e Protinus Temporis, são extremamente difíceis de realizar, mas penso que talvez eu consiga.

- E então, quem vai embarcar nessa emocionante aventura? – perguntei, ansiosa para saber quem seria o pobre coitado.

- Temo que não tenhamos alternativa... – começou o Sr. D, encarando Dumbledore, que afirmou com a cabeça, como se já soubesse o que ele iria dizer - ... Se não você, .

E foi aí que meu queixo caiu.


Capítulo 2 – Você Só Pode Estar Brincando


Caí na gargalhada.

Sério, comecei a rir tanto que fiz até aqueles barulhos estranhos que parecem um ronco.

Agradeço que Dumbledore e o Sr. D não sejam possíveis pretendentes românticos, ou senão eu teria que riscá-los imediatamente da minha lista.

Eles apenas continuavam a me encarar. Dumbledore esboçava um leve sorriso no rosto, e me olhava com ternura através dos óculos de meia-lua, e o Sr. D me encarava com aqueles olhos esbugalhados com a maior cara de reprovação.

- Isso foi engraçado, de um modo cruel. Mas e então, quem vai? – Perguntei novamente, enxugando as pequenas lágrimas que tinham se formado em meus olhos, do tanto que eu havia rido.

Os dois me encararam como se eu fosse mentalmente inferior a uma capivara.

- Você, . Você é a única que possui maiores chances de realizar essa missão. Não que eu esteja feliz com isso, não estou mesmo! Se fosse possível, eu iria em seu lugar sem pestanejar – disse o Sr. D, me olhando calorosamente.

- Sabe, agora você está realmente me assustando porque eu não acho mais que esteja brincando – eu disse.

- Infelizmente, não é uma brincadeira.

- Mas... mas... mas... – Ok, é mais difícil formar uma frase coerente quando você está nesta situação (a de descobrir que você terá que voltar no tempo para matar o maior Lorde das Trevas de todos os tempos, eu quero dizer) do que parece – Mas por que eu? Sério, por que não Harry Potter? Tenho certeza que ele se sairia bem melhor do que eu.

- Seria extremamente arriscado, mandar o Harry – dizia Dumbledore – Ele possui parentes que estudavam em Hogwarts naquela época, cuja semelhança é enorme. E sua ligação com Voldemort, através da cicatriz, da varinha, da profecia, entre outros, poderia causar uma perigosíssima ruptura no tempo atual. Além do mais, se o Voldemort atual percebesse sua ausência, poderia desconfiar de algo.

"Blá, blá, blá", era só o que eu ouvia.

- E quanto a você? E você, Desiré? E alguém da Ordem, mais velho e experiente? – Sugeri, sentindo o desespero tomar conta da minha voz.

- Como já disse, , ficaria feliz em ir em seu lugar. Entretanto, Dumbledore não poderia ir de jeito algum, pois o Dumbledore do passado certamente acharia peculiar ver seu eu-do-futuro andando por ai e eu preciso ficar e tomar conta da Armée. Alguém da Ordem, constantemente vigiada por Voldemort, levantaria suspeitas. O ideal seria alguém da Armée, e a pessoa perfeita é você, até porque quanto menos pessoas ficarem sabendo disso, melhor.

Me afundei na confortável poltrona de Madame Maxime.

Aquilo só podia ser brincadeira.

Tudo bem, eu participava da Armée de la Lumiére, fazia todo o meu trabalho da melhor maneira possível, espionava, chutava alguns traseiros de vez em quando e tudo o mais.

Quero dizer, eu sou mesmo bem durona.

Mas... Isso?

Isso?

Eu te falo o que isso é:

Suicídio. Suicídio dos brabos.

- , você é perfeita para essa missão. É jovem, inteligente... – incentivava o Sr. D, se aproximando da mesa com uma expressão de simpatia – ... E corajosa! Eu e toda a Armée confiamos em você, e conhecemos sua capacidade. Você será perfeita para se passar por uma aluna na época dele de escola.

Meus olhos começaram a ficar úmidos.

- Mas... mas e se eu não conseguir? E se eu decepcionar a vocês e ao resto da humanidade e todo mundo virar jantar de Voldemort? Por minha causa? – choraminguei.

Mas, puxa, era mesmo uma responsabilidade e tanto! Só Merlim sabe como eu fico desastrada quando estou nervosa.

E eu teria que matar alguém? Matar uma pessoa? Eu mal consigo matar uma barata.

Se bem que não acho que ele vá fazer aquele barulho crocante nojento quando morrer.

E se eu matar a pessoa errada? Afinal, eu nem mesmo sei como era o Voldemort antigamente.

Será que ele era feioso e ofídico desde aquela época?

Bem, neste caso não terei grandes problemas em identificá-lo.

Mas, pensando bem, o que diabos eu sei sobre a vida dele? Nem sei qual é o seu nome verdadeiro.

A não ser que seja mesmo Voldemort. Puxa, se for, não é a toa que ele é assim, tão revoltado.

- Não importa, . É uma tentativa, e uma das únicas que possuímos. Além do mais, não acredito que você irá falhar – disse o Sr. D.

- Eu concordo com o Desiré, srta. – falou o Dumb – Temo que não tenhamos muita escolha. E não temos muito tempo, também.

Bem, parece que eu não tinha muitas alternativas.

Como eu conseguiria dizer não para a tentativa de salvar o mundo?

- Bem – suspirei – Então vamos nessa.


Capitulo 3 – Faça as malas, você irá para 1944.

Encarei a mala aberta e vazia na minha frente.

Dumbledore me mandou arrumá-la o mais rápido possível. Mas, quero dizer, como eu vou saber o que colocar em uma mala para ir direto para o ano 1944?

A única coisa que eu tenho até agora é o uniforme de Hogwarts que, vou te contar, não é exatamente o mais bonito do mundo.

E que barulho irritante é esse?

Ah, sim, são batidas na porta.

- Pode entrar! – resmunguei.

- Precisa de ajuda, srta. ? – perguntou Dumbledore, entrando calmamente no dormitório que estava vazio, a não ser por mim. Você sabe, as outras pessoas estavam jantando felizes, enquanto eu estava arrumando as malas para voltar ao passado e chutar o traseiro do Dark Lord e tudo mais.

- Não, não. Estou indo muito bem, como você pode ver – falei, irônica, apontando para a minha mala vazia.

- Apenas coloque tudo que trouxe para cá – sugeriu o cara, como se fosse uma coisa óbvia. Não é a toa que ele sai por ai usando uma túnica enorme que nenhum bruxo usa desde, hm, sempre. Não é exatamente o maior entendedor de moda do país.

- Mas minhas coisas não estavam na moda em 1944 – exclamei, indignada com a sugestão dele.

Ele riu.

- Deixemos isso para depois, temos que conversar sobre como será sua chegada – disse ele, sentando-se na cama ao lado da minha mala.

- Ok, pode mandar o papo enquanto eu escolho as roupas – eu disse, olhando para a montanha de roupas que eu havia feito no chão.

- Primeiro, pegue isto – falou Dumb, tirando um envelope pardo muito recheado de dentro das vestes – guarde-o com cuidado e, quando chegar, entregue-o para o meu "eu do passado".

- Uau, genial! E o que tá escrito? – perguntei, segurando o envelope nas mãos.

- É uma carta para mim mesmo, explicando os acontecimentos. Eu irei entender – explicou ele, dando um sorrisinho orgulhoso de "minha idéia foi genial".

Bem, e foi mesmo.


- Ok – falei, já colocando no bolso do lado de dentro daquele casaco horroroso do uniforme de Hogwarts.

- E também tem isto – disse ele, tirando outro envelope desta vez mais fino – É uma carta para o professor Dippet, diretor de Hogwarts daquela época, explicando sua transferência de Beuxbatons para lá.

- Ok, certo – disse, também enfiando no bolso do casaco.

- Agora... – começou o cara, levantando-se da cama e fazendo uma cara séria – sobre Tom Riddle.

- Quem é Tom Riddle? – perguntei, finalmente achando algo decente na montanha de roupas e colocando na minha mala.

- Tom Riddle é Lord Voldemort – explicou.

Ah tá.

- Ah, saquei – falei, parando de procurar roupas para prestar mais atenção.

- Há algumas coisas que acho que você deveria saber sobre ele – começou Dumbledore, me encarando – Ele é o monitor chefe da época para onde você irá se deslocar. Isso irá ajudar a localizá-lo, já que você será nomeada monitora da casa que estiver.

- Jura? E como vou conseguir isso?

- Está tudo resolvido nas duas cartas que te entreguei – explicou ele – Creio que você deve saber também que ele é muito inteligente, e qualquer deslize de sua parte pode despertar uma desconfiança.

Ah, que ótimo. Sinto-me muito mais tranqüila agora.

- Por isso sugiro uma aproximação mais... lenta, discreta. Ele sempre teve o costume de andar sozinho, então talvez seja difícil... mas isso é com você, confio no seu plano.

Ah, ok, como se eu tivesse algum.

- E um dos maiores conselhos: de modo algum confie nele. Esse foi o maior erro de todos daquela época. Todos foram... "seduzidos" pela lábia infalível de Riddle, fazendo com que ele conseguisse sempre tudo o que queria.

- Pode deixar, não caio em lábia de homens – falei. E é verdade. Quero dizer, não que muitos tenham tentado usar sua lábia em mim, mas a parada de 'não confie em homens, são todos uns babacas' e tudo o mais, eu já sabia.

- E há mais uma coisa que achei que você poderia saber... – continuou Dumbledore – Nunca, em toda sua vida, Tom Riddle foi exatamente... feliz.

Ahhh, tipo, dane-se.

- Bem feito! – Resmunguei, fazendo uma careta. Dumbledore me olhou com censura.

- Não estou dizendo isso para defendê-lo, só acho que... você deveria saber – disse Dumbledore, com o cenho franzido e os olhos azuis-bebê refletindo uma preocupação genuína - Bem, quando se sentir pronta, me encontre nos jardins. Vou aproveitar para beliscar mais algumas balinhas de chocolate salgado que vocês têm por aqui, são realmente muito saborosas. Até mais! – falou o cara, dando o fora dali.

Hm, isso pode demorar um pouco.

- Antes tarde do que nunca! – Exclamou Dumbledore quando cheguei aos jardins, tipo, duas horas depois, já com a mala pronta.

- Estou pronta, vamos acabar logo com isso.

- Antes, tenho que avisar uma coisa, por pouco não me esqueço. A partir de agora, você é Katherine Holland Schiffer.

- O quê? Por quê? – Perguntei, indignada, e fazendo uma careta por ele ter dito o nome Katherine Holland Schiffer.

Eu queria o meu nome ué!

- É melhor você ter uma nova identidade, para evitar problemas – Explicou Dumbledore.

– Não queremos que você apareça lá com um sobrenome de uma família não existente. – Adicionou e eu me lembrei que eram aceito poucos os alunos nascidos trouxas, e que o preconceito era maior do que agora. Então se eu não quisesse ser morta torturadamente, era melhor eu aceitar.

- Ah. Bem, então tá.

- Antes de tudo, vamos checar se você colocou todas as coisas fundamentais na mala. Livros didáticos do sétimo ano de 1944? – Começou o sr. D, botando minha enorme mala no chão e abrindo-a.

- Dumbledore me entregou todos – Respondi, apontando para o monte de livro atolado no canto da mala.

- Os envelopes que te entreguei? – Perguntou Dumbledore.

- Aqui – Falei, passando a mão pelos bolsos das vestes, onde eles estavam.

- Vestes de Hogwarts? – Foi a vez do sr. D perguntar.

- Infelizmente, aqui – Resmunguei, olhando com desprezo para as vestes horríveis que estavam no topo do malão. Dumbledore fazia uma cara pensativa, como quem pensava em algo mais que eu poderia precisar, e o sr. D olhava minha mala.

- ... – começou Desiré – O que diabos é isto? – perguntou, se abaixando e pegando uma coisa pequena e rosa da minha mala.

Oh-oh.

- É o meu, hã... Ipod – Respondi, sem graça por ter sido descoberta. Ah, cara, eu tinha escondido ele tão bem na mala! Droga de olhos esbugalhados do sr. D que enxergam além do que deveriam.

- Ipod? Aquele aparelho trouxa de ouvir música? ! – Repreendeu-me o Sr. D.

- Ah, qual é! Eu vou precisar de algum tipo de diversão – Reclamei, tirando o Ipod Nano rosa da mão dele.

- Você sabe que aparelhos eletrônicos não funcionam em Hogwarts! – Falou o sr. D, olhando para Dumbledore como quem pedia apoio na discussão.

- Eu sei, dã, por isso eu o alterei magicamente – Expliquei, também olhando pra Dumbledore.

- Não vejo maiores problemas dela levar, se ela realmente deseja. Contanto que ninguém veja, é claro – Disse Dumbledore, calmamente. Ergui minhas sobrancelhas em sinal de "se ferrou" para o sr. D, que franziu o cenho.

- Acho que está tudo certo, então – Concluiu Dumbledore, tirando a varinha das vestes. Meu coração começou a martelar incrivelmente rápido no peito. – Lembre-se, quando a missão for cumprida e for hora de voltar, peça para o meu Eu-do-passado realizar o feitiço certo para você. Vai dar tudo certo, srta. . Ou melhor, srta. Schiffer.

Já meio em pânico, olhei para o sr. D, que abriu os braços para me abraçar.

- Boa sorte, . Você vai ser sair bem, tenho certeza. A Armée vai estar torcendo por você – Disse o cara, com lágrimas nos olhos enormes. Eu também choraria, se:

a) Eu não estivesse em pânico demais para isso.

b) Eu não fosse do tipo que evita chorar, sempre que possível.

c) Eu não estivesse usando o Rímel L'Oreal (que deixa os cílios enormes, curvados e lindos, aliás) que não é à prova d'água.

- É, é o que eu espero – Falei, indo em direção ao Dumb. Ele me abraçou calorosamente, como um vovô abraçando a neta, e falou num tom de voz que só eu conseguia escutar:

- Lembre-se, as maiores batalhas não são vencidas na força.

Não entendi muito bem o que ele quis dizer com isso.

- Bem, está na hora. A chave do portal irá te levar à minha sala de 1944, em Hogwarts – Dizia Dumbledore, enquanto eu fechava minha mala e me agarrava a ela.

- E qual é a chave do portal? – Perguntei.

- Essa pena – Respondeu Dumbledore, me entregando uma pena bonita e preta. Segurei minha mala em uma mão, com força, e a pena com a outra. – Você deve sentir um leve puxão no umbigo. Segure-se! TERGUM TEMPORIS!

E aí tudo ficou preto.


Capítulo 4 - Não É Todo Dia Que Se Conhece Um Lorde das Trevas


Quando abri os olhos, vi que estava em uma sala escura e cheia de prateleiras com coisas nojentas. Não pude deixar de sentir um alívio enorme. Um alívio tão grande que me fez tossir. Afinal, eu estava viva! A primeira etapa tinha sido concluída! Me levantei sentindo uma pontada nas costas por ter caído de mal jeito, e fui avaliar uma das prateleiras que continha um pote com algo que parecia um olho humano dentro.

- Parece olho humano, não é mesmo? – ouvi uma voz doce atrás de mim dizer, fazendo com que eu levasse um susto. Me virei, dando de cara com um Dumbledore bem mais novo, que olhava pra mim com o mesmo olhar de ternura que ele sempre teve por sei lá quantos anos. – Mas é apenas Mati Egypcium, uma criatura que quando segurada nas mãos por mais de 5 segundos faz com que você tenha a exata aparência da pessoa por quem você nutre sentimentos mais fortes, como amor ou ódio. E quando adicionado a um extrato de Orquídea Asiática, diminui em 75% as rugas faciais.

Dei apenas um sorrisinho fraco e sem graça, ainda meio em choque pelo susto. Ele se aproximou, sorrindo, e perguntou:

- E então, vai me dizer quem é você?

Foi aí que eu me lembrei em que ano eu estava. Enfiei a mão no bolso das vestes, tirando o grosso envelope de lá, entregando-o logo depois para Dumbledore. Ele sorriu, de novo, e pegou o envelope, lendo seu conteúdo logo em seguida. Esperei ele terminar de ler mordendo o lábio inferior e balançando para trás e para frente, que nem uma perfeita idiota.

- Sim, sim – murmurava Dumb para si mesmo. Eu, pessoalmente, esperava uma reação bem maior – muito bem, creio que você tenha algo para entregar ao Dippet, certo?

- Ah sim, tenho sim! – disse, tirando outro envelope das minhas vestes e entregando ao Dumb.

Ele pegou, sorriu e o guardou, logo depois se sentando na cadeira em frente à mesa "principal" que havia naquela sala.

- Devo dizer que isso não estava no meu planejamento diário – comentou Dumb, dando uma risadinha – mas, pelo menos, é mais emocionante do que o meu itinerário previa!

- Eu que o diga! – Suspirei, me largando em uma das carteiras que haviam ali.

- E não posso dizer que estou surpreso... no fundo creio que eu sempre soube que isso poderia acontecer – dizia ele – A senhorita deve ser mesmo muito corajosa. Arriscar a própria vida em uma missão perigosa como essa, para salvar o mundo. Atitude admirável, realmente admirável... então, já tem algum plano?

- Não tenho nem um "plano" – resmunguei, abaixando a cabeça e apoiando-a na mesinha da carteira aonde eu estava sentada, de repente me sentindo muito sonolenta.

- Bem, teremos que trabalhar nisso então, não? Acho que não é prudente que eu me envolva muito com seus planos, mas saiba que se precisar de qualquer auxílio pode recorrer a mim. Venha comigo, vou te levar até a enfermaria, você poderá tirar um cochilo e comer um chocolate por lá para renovar as energias, e mais tarde peço madame Harrods para te acordar para o jantar – Dizia Dumbledore, já saindo da sala, me obrigando a levantar da confortável cadeira e segui-lo – Deseja mais alguma coisa, Srta.Schiffer?

Fiquei quieta alguns segundos, até me lembrar que, bem, eu era a Srta.Schiffer.

- Não, obrigada. Um cochilo e algumas barras de chocolate é tudo que eu preciso – Resmunguei, enquanto arrastava minha incrivelmente pesada mala e andava. Andamos o que pareciam quilômetros, até chegar numa salinha onde tudo era muito branco e limpo, que presumi ser a Ala Hospitalar.

- Jacinta? – Chamou Dumb, fazendo com que uma mulher assustadoramente alta e magrela com um nariz enorme aparecesse, sorrindo.

Desculpa aê as Jacintas do mundo, mas eu tenho que comentar:

Jacinta? Que nome engraçado.

- Olá Alvo! Em que posso ajudar?

- Esta é Katherine Schiffer, acabou de ser transferida de Beauxbatons e está exausta. Como não participou da seleção das casas ainda, imaginei que ela poderia repousar aqui, até o jantar.

Jacinta Harrods me olhou, e meu estado deveria estar realmente péssimo, pois ela fez a maior cara de pena e me levou depressinha para uma cama, dizendo:

- Pobrezinha, a viagem deve ter sido muito cansativa. Você veio de carruagem? Não vi nenhuma chegando!

Arregalei os olhos. O que eu responderia? 'Não, acho meio difícil eu ter vindo de carruagem porque elas não viajam no tempo'?

- A senhorita veio de trem. Ela já estava no país, mas mesmo assim é uma viagem e tanto, não? Bem, tenho que corrigir algumas redações antes do jantar, não se esqueça de acordá-la. – Disse Dumbledore, salvando minha pele, e logo depois saindo pela porta.

- Bem querida, pode se deitar. Vou trazer chocolate quente pra você. Se quiser mais alguma coisa pode me chamar, ok?

Não respondi, pois estava me jogando na cama, já dormindo praticamente no meio do caminho.

- Srta.Schiffer? – Ouvi uma voz que parecia muito distante chamar. Ignorei. – Srta.Schiffer? Katherine?

Madame Harrods me chamou por horas, e eu, cheia de chocolate relaxante nas idéias, não conseguia perceber que aqueles nomes supostamente eram meus. Por isso só acordei quando ela tirou o lençol de cima de mim, fazendo com que eu sentisse um vento gelado congelar minhas pernas.

- Me deixa em paz – Resmunguei, tentando arrancar o lençol das mãos finas dela. Não sou muito simpática quando me acordam.

- Srta. Schiffer, está quase na hora do jantar! Você tem que se arrumar! – Continuou Jacinta, num tom mais irritado. – Dumbledore falou que você pode usar o banheiro da enfermaria, depois é só deixar sua mala aqui, arrumada, e ir para o jantar.

Murmurei qualquer coisa, me levantando irritada, pegando minha mala e chutando-a em direção ao banheiro minúsculo que havia ali, para poder me arrumar.

Ok, devo admitir que o jantar não foi de todo ruim. Se bem que não sei se conta o fato de que eu não comia há horas ou que uma viagem no tempo pode ser bem esfomeadora.

Mesmo assim, não posso deixar de perguntar:

Qual é a do suco de abóbora?

Quero dizer, que nojo. Eles encarnam totalmente o papel de Bruxa Onilda nessa escola. Lá em Beauxbatons a gente bebe coisa de verdade, como cerveja amanteigada (sem álcool, é claro, mas é melhor do que essa gosma laranja que eles chamam de suco) ou um bom hidromel.

De todo o modo, durante o jantar o diretor Dippet anunciou a transferência de uma nova aluna (no caso eu, caso tenha fugido à memória), fiz todo o processo de seleção caindo, obviamente, na casa do Voldemort, a Sonserina, e depois sendo nomeada Monitora-Júnior, o que causou certa controvérsia uma vez que esse cargo nem ao menos existia.

Mas, quero dizer, se virem ai seus invejosos sedentos por poder, quem está no comando agora aqui sou eu.

Ok, monitora júnior não deve ter muito poder, uma vez que Dumbledore inventou esse cargo só para me aproximar do Voldi, que é Monitor-Chefe. Mas pelo menos posso dar uns chutes nos traseiros de alguns pirralhos irritantes. Não que eu seja totalmente a favor da violência, mas esses pirralhos podem ser bem descontrolados.

Enfim, só sei que não consegui localizar o Voldemort-versão-17-anos, mesmo teoricamente estando sentada na mesma mesa que ele. Não que eu saiba como ele seja, mas as pessoas mais feias da mesa não estavam com o broche de 'Monitor Chefe', e depois que toda aquela comida surgiu na minha frente eu meio que esqueci de continuar a procurar.

Depois que o jantar terminou, todo mundo se misturou numa velocidade tão impressionante que eu já nem sabia pra onde ir. Por isso resolvi tentar achar o caminho por conta própria. Saí do salão principal e fui andando pelos corredores escuros, à procura de um local específico: a cozinha. Andei por uns trinta minutos (para quê uma escola tão grande? Céus), até achar o que eu queria.

Entrei na cozinha discretamente, com um brilho no olhar. Não tinha bebido aquela gororoba no jantar, então precisava desesperadamente de líquido. Vi vários elfozinhos andando de um lado para o outro, apressados, para limpar toda aquela louça suja. Um deles percebeu minha presença e franziu o cenho, se aproximando:

- O que a senhorita está fazendo aqui? Não é permitida a entrada de alunos! A senhorita deve se retirar já! Já!

- Segura as pontas aí, baixinho! Eu vim em paz, só quero algo pra beber.

- Creio que oferecemos suco de abóbora em quantidades suficientes no jantar de hoje! – Guinchou o elfozinho, com os olhos arregalados em pânico de alguém me achar ali.

- Argh, exatamente. Quero alguma bebida de verdade. Que tal uma cervejinha amanteigada? – Propus, me direcionando para um compartimento que parecia ser onde eram mantidos os líquidos. O elfo parou na minha frente.

- Certo, se eu te der o que a senhorita quer, a senhorita irá embora? – questionou.

- Aham, claro, contanto que pare de me chamar de 'senhorita'. Pode me chamar de ...Katherine. Kate, é, Kate. E você, como chama?

O elfo pareceu levemente desconfiado, mas depois seus olhões se encheram de lágrimas, embora ele tenha olhado para baixo para disfarçar.

- Sabe, senho... Kate, não é sempre que um bruxo pergunta o nome de um elfo! Ainda mais uma senhorita tão graciosamente bela como você! Me chamo Felix. E então, o que quer mesmo? – Disse Felix, indo na direção do compartimento e o abrindo, agora parecendo muito mais amigável.

Dessa vez foram meus olhos que se encheram de lágrimas. Quero dizer, não é todo dia que eu recebo elogios, então costumo ficar assim quando recebo um, mesmo que seja de um elfo. Puxa, eu sei que não sou nenhuma baranga, então não sei porque as pessoas não me dizem essas coisas legais com mais freqüência. Tudo bem que posso parecer um pouco estranha e durona às vezes, mas não quer dizer que eu não goste de um elogio, certo?

- Cerveja amanteigada seria ótimo! – pedi, dessa vez com lágrima nos olhos ao vê-lo encher um copo daquele conteúdo precioso, me entregando logo depois. – Puxa, obrigada mesmo, Felix! Você salvou minha vida.

Felix deu um sorriso satisfeito como resposta, e então eu aproveitei para perguntar:

- Hm, você sabe o caminho para o salão comunal da Sonserina? É o meu primeiro dia aqui e eu não poderia estar mais perdida.

Felix me explicou rapidamente e eu fingi que entendi, me despedindo e saindo da cozinha logo depois. Encarei aquele labirinto de corredores e escadas, respirei fundo e tomei um gole da minha cerveja antes de começar minha jornada.

Ah. Álcool etílico amanteigado, sempre bate fundo.

Dei uns passos para frente, e ao virar o primeiro corredor vi um cara descendo uma escada. Olhei para seu uniforme para tentar identificar a casa, vendo logo que era da Sonserina, e vendo logo depois algo que me fez tossir.

O broche de "Monitor-Chefe".

Era ele. Voldemort.

....

Certo.

Do jeito que eu falei agora não ficou tão aterrorizante como eu estava imaginando.

Logo após eu conseguir ler o broche, ele virou, ficando de costas para mim, antes que eu pudesse ver seu rosto. Só consegui ver que ele tinha cabelos escuros, que balançavam levemente enquanto ele andava.

É agora, pensei.

- Hm, ei! – Falei, em tom alto, enquanto dava uma corridinha para alcançá-lo. Ele parou, virando-se logo depois.

A única coisa que consegui pensar foi a expressão mais repetida entre os ingleses, logo, a que mais tenho ouvido nas últimas 24 horas pelos corredores.

Bloody Hell.
Voldemort não era nada como eu havia imaginado.

Seu cabelo escuro era muito bonito e milimetricamente arrumado, contrastando com sua pele pálida. Seus cílios eram grandes, emoldurando o par de olhos azuis acinzentados. Seu rosto fino tinha contornos bem definidos e aristocráticos. Sua boca clara bem desenhada e fazia uma linha reta fina.

Ou seja:

Extremamente beijável.

Não que eu vá admitir isso em publico.

E aí a única coisa que conseguir fazer depois que ele virou foi tossir, de novo.

Matem-me.

- Hã, oi. Você deve ser o monitor chefe! – Disse, depois de recuperar as estruturas.

Ele não pareceu demonstrar nenhum tipo de emoção enquanto eu me aproximava, parando à apenas alguns passos dele.

- Considerando que estou usando o distintivo escrito "monitor chefe", que apenas o Monitor Chefe possui, creio que dá para concluir isto, não? – disse ele, numa voz moderada, não muito grossa e nem muito fina.

E aliás, há há. Muito engraçadinho, para um Lorde das Trevas.

- Sou Katherine! – Me apresentei, com a voz um pouquinho esganiçada – Katherine Schiffer.

- Eu sei – ele replicou, enquanto parecia me analisar, indiferentemente – Dippet anunciou seu nome no jantar. Duas vezes.

Ok, então Dumbledore não estava brincando ao dizer que ele era bastante perceptivo.

Senti minhas pernas começarem a tremer, talvez de nervosismo por estar de cara com o cara que se tornaria o Rei do Mal, talvez porque ele era bem mais gato do que eu planejara, ou talvez porque estava frio e aquela saia ridícula e aquela meia três quartos não esquentavam nadinha.

Mas, vou te contar, mesmo ele tendo a beleza de um Deus grego, eu não podia deixar de sentir um ódio crescendo dentro de mim, afinal, não dava para esquecer quem ele havia se tornado. Porém, manti meu sorriso bobo e falei:

- "Olá Katherine, sou fulano, muito prazer".

Voldemort me encarou mais profundamente por um instante, com uma mão casualmente dentro do bolso das vestes e a outra mexendo na varinha, quase que inocentemente.

Esperei alguma resposta me sentindo ainda mais nervosa e quase ansiosa, com aquele olhar dele me deixando, no mínimo, enlouquecida. Cruzei os braços, com cuidado para não derramar minha preciosa cerveja, sentindo que aquela situação estava destruindo meus neurônios um por um.

De repente, ele tirou a mão que estava no bolso e a estendeu, como se esperando que eu a apertasse.

Confesso que dei um pequeno pulo para trás com seu movimento, quero dizer, eu estava realmente nervosa, e quando me encontro nesse estado, qualquer movimento brusco me assusta. Ele franziu levemente o cenho, como quem estava me achando uma perfeita idiota, e disse, num tom quase entediado:

- Olá Katherine, sou Tom Riddle, muito prazer.

Tom Riddle?

....

Ah, é, tá certo. Ele não ia se apresentar como Lord Voldemort né, obviamente.

- Tudo bem, não precisava ter repetido exatamente as mesmas palavras.

- Não costumo fazer esse tipo de formalidade.

- É? E por que este protesto contra formalidades?

- Não vejo razões para fazer – ele respondeu, dando de ombros, embora parecesse levemente surpreso por eu ainda estar interessada em continuar a conversa – Como você pode ter tanta certeza que é um prazer me conhecer, se você nunca nem me viu?

- Hã, isso se chama educação.

Ele não respondeu, apenas continuou me encarando.

Cara, ele era bom nisso.

De qualquer modo, foi aí que eu tive a minha primeira idéia do dia. Quero dizer, uma hora eu sabia que ia sair, eu não faço parte da Armée à toa, e muito menos eles me mandaram para cá porque eu sou uma incompetente.

Apertei finalmente a mão dele, que ainda estava estendida. Ele tinha um aperto forte e confiante, perfeito para quem dominaria um império das trevas uns anos depois. Bem na hora que sua mão se fechou na minha com força, rolei meus olhos para trás e, sem pensar duas vezes, relaxei todos os músculos do meu corpo, me deixando cair, ouvindo apenas o som do meu copo caindo e rolando no chão.

Nosso aperto de mão tinha sido tão forte, que eu estava quase levando ele ao chão comigo. Torci internamente que ele fosse pelo menos homem o bastante para não deixar que eu esmagasse minha cabeça caindo com tudo naquele piso de mármore destrutivo.

Ouvi ele xingar numa voz quase inaudível e ao mesmo tempo segurar meu braço para cima, logo depois tentando erguer meu tronco, segundos antes dele atingir o chão.

Quando ele conseguiu equilibrar meu corpo, me levou devagar ao piso, onde eu me esparramei.

Contei mentalmente até cinco, antes de começar a abrir meus olhos de forma meio débil. Para te contar a verdade, eu não sabia direito o que fazer. Nunca desmaiei em minha vida, não sabia muito bem o que as pessoas que desmaiavam faziam.

Bem, espero que ele também não.

Fiz um barulho estranho, uma espécie de "ahmmmnn" sofrido, e abri totalmente meus olhos,vendo a cara alarmada de Tom Riddle bem na minha frente.

- O que ac... – comecei, fazendo a melhor voz de donzela indefesa que consegui – eu desmaiei?

Riddle estreitou os olhos, me encarando profundamente como se estivesse... sei lá, tentando ler a minha cara.

- Isso acontece com frequência? – perguntou, em um tom meio desdenhoso, enquanto eu me sentava, massageando minha testa. Olhei pra ele, que, antes ajoelhado, também se erguia.

- Hã... não, quero dizer, sim, de vez em quando – respondi, já começando a ficar ainda mais nervosa, temendo que ele desconfiasse de algo. Então, tomei coragem para dizer uma frase ridícula que nunca pensei que diria, no melhor tom "I-see-dead-people" que eu consegui: - às vezes, quando eu toco em alguém, eu vejo coisas.
Reparei, com muita satisfação, uma espécie de flash de pânico passar pelo seu rosto.
- É meio esquisito, para falar a verdade. Normalmente eu não costumo desmaiar, só quando eu tenho, hm, visões bem fortes. Mas, bem, nada melhor do que dar uma caída no chão para levantar o astral, né? – continuei, tentando parecer casual, como se fosse algo com que eu já havia me acostumado.

E tão rápido quanto aquela expressão de apreensão tinha surgido na cara dele, ela desapareceu, dando lugar a uma outra completamente apática.

- E o que você viu, quando tocou em mim? – ele perguntou, cruzando os braços, parecendo totalmente descrente.

É, bem, eu também não sou de acreditar em videntes e coisa do tipo, mas tudo pode mudar, certo?

Torci um pouco a cara, como quem tentava se lembrar, depois pisquei pesadamente e, olhando para o fundo daquele olho azul, perguntei:

- O que é um Voldemort?


Capítulo 5 – Amigos da onça (ou melhor, serpente)


Logo depois de ouvir aquelas palavras saindo da minha boca, me arrependi veementemente.

Quero dizer, puxa, eu tinha realmente me esquecido o quão vulnerável eu estava naquele corredor escuro e deserto.

"Ele vai me matar, ele vai me matar, ele vai me matar", era só o que minha mente era capaz de repetir.

Meus olhos estavam grudados na mão que segurava a varinha, que ele balançava calmamente, com os braços ainda cruzados, atenta a qualquer sinal de que ele iria me lançar um grande e gordo "Avada Kedrava".

Resolvi, então, olhar para seu rosto, que estava inexpressivo. Quando fiz a pergunta, contudo, notei outro flash de pânico passar pela sua cara constantemente apática, e foi aí que eu comecei a achar que ele ia me matar.

- Era o nome da minha cobra de estimação que morreu neste verão – ele respondeu, com a maior naturalidade do mundo, que quase fez com que eu mesma acreditasse.

- Oh – fiz, sem saber direito o que dizer – Sério? Puxa, ter cobras de estimação na nossa idade é meio patét... – comecei, mas deixando a voz morrer. Acho que chamar o Lorde das Trevas infanto-juvenil de patético não é lá uma idéia muito saudável.

- O quê?

– Patét. É uma gíria pra "super legal".

Ele ergueu uma sobrancelha, enquanto eu começava a me levantar.

Notei que qualquer movimento que eu fazia ele avaliava intensamente, como se estivesse achando que a qualquer momento eu poderia ter visões e desmaiar de novo.

Quero dizer, eu acabei de me fingir de vidente que visualizou seu "apelido" do mal, ele deve estar, no mínimo, pirando.

Esperei ele falar mais alguma coisa, mas só continuava me encarando com aqueles olhos acizentados profundos. Quando eu senti que meus miolos estavam começando a explodir com isso tudo, falei:

- Bem, boa noite então! Au revoir – E me mandei. Não sou tão louca a ponto de ficar mais tempo sozinha em um corredor com o futuro Lorde das Trevas. E pelo olhar dele, (na minha cabeça) o meu caixão já deveria ter sido encomendado.

Quando botei o pé no salão comunal da Sonserina, todos os olhares se viraram em minha direção. Aparentemente, nem os cobrinhas tem o costume de andar por aí no castelo depois do jantar sem permissão.

- Se perdeu, Beauxbatons? – Ouvi uma voz masculina perguntar alto, gerando risadinhas.

O pessoal da década de 40 certamente tem muito senso de humor.

E o quê eu falei na linha acima foi uma ironia.

- Na verdade, sim – respondi, de repente me sentindo uma gazela cercada por leões enormes de trinta cabeças. Aqueles sonserinos decididamente não tinham caras muito simpáticas. Eram quase mais assustadores do que o Voldemort em miniatura.

- Não liga pra ele, é só o Devon – disse uma garota com a maior cara de loira burra do universo – ele está com inveja por você ter sido nomeada monitora. Ele almeja este cargo fervorosamente, ficou uma fera quando o perdeu para o Santo – explicou a menina, mas eu continuava completamente perdida.

"Almeja", "fervorosamente", "fera"?

Que tipo de vocabulário era este?

E quem diabos era o "Santo"?

Antes que eu pudesse abrir a boca para resmungar qualquer coisa, o tal Devon se levantou de onde estava.

Merlin, se eu soubesse que os homens da antiguidade possuíam tamanha beleza, eu já teria vindo pra cá antes.

Devon era um garoto de provavelmente uns 1,90 m de altura, mas não 1,90 m desengonçados, e sim majestosamente sensuais, com um peso bem distribuído. Ele tinha cabelos loiros numa cor quase ouro, que eram cuidadosamente jogados para trás, e os lábios finos e bem desenhados estavam crispados em desdém.

- Dippet sabe que eu sou mais do que indicado para este cargo, e agora inventa este tal de "monitor júnior" e o oferece para a novata francesa? – resmungava, enquanto se aproximava e parava bem na minha frente, me encarando da cabeça aos pés com os olhos cor de amêndoa.

- Se você fosse tão indicado, ele teria te oferecido. Mas não ofereceu, então é só sentar e chorar, e dar licença para eu poder ir dormir – disse, sem noção nenhuma do perigo.

A loira-burra do meu lado fez um "oh" discreto, e de repente notei que agora todos tinham realmente parado de fazer o que quer que fosse que estavam fazendo para observar a situação.

E aí minhas pernas começaram a tremer.

Quero dizer, eu passei toda a minha vida de colegial tentando ser o mais invisível possível. Estou falando sério, eu era uma total figurante. Puxa, posso ter entrado na Armée, arrasar como espiã, ter enfrentado alguns mal-encarados com tranqüilidade, aceitado essa missão dos infernos, mas quando se trata de estudantes adolescentes com os hormônios totalmente fora de controle e prontos para encontrar uma nova vitima cuja vida eles almejam fervorosamente arruinar, eu fico completamente aterrorizada.

E normalmente todos colaboravam com meu status de invisibilidade. Mas, agora, aqueles serpentinos imbecis estavam me botando mais em evidencia do que eu certamente gostaria.

Devon abriu a boca para começar a dizer algo, com o cenho tão franzido e a veia nas têmporas pulsando tanto que ele estava parecendo um desenho animado meio bizarro.

E aí, antes que ele dissesse algo, eu saí andando em direção a uma das duas escadas que havia no meio do salão.

Não que eu estivesse fugindo nem nada, só estava querendo evitar, você sabe, uma situação chata.

Ou minha possível morte.

Aparentemente, o fato de eu ter ignorado o bonitão era bem chocante, pois todos ali me encaravam com uma cara de pura surpresa. Tentei não reparar, andando firme até a escada, com a loira-burra vindo atrás.

- É a escada da direita! – ela indicou, baixinho.

- Ah, obrigada – falei, indo em direção à escada certa dessa vez. Fui subindo, com ela ainda em meus calcanhares. Cheguei no dormitório, onde rapidamente encontrei a cama que continha minha mala ao seus pés. Fui andando, apenas vendo aquela sombra loira atrás de mim.

- Sou – loira-burra se apresentou – McNair. Ou somente .

- Oi – respondi distraidamente, enquanto procurava meu pijama no malão.

- E o seu nome, qual é? – perguntou a cachinhos dourados. Suspirei. Tudo que eu queria era dormir. Puxa, é pedir muito?

- Sou Katherine, ou Kate, ou K, ou Kiki, o que você quiser, não me importo muito – respondi, mal prestando atenção ao que eu dizia, sorrindo ao ver meu pijaminha azul de seda enterrado no fundo da mala.

riu, perguntando:

- Posso mesmo te chamar de Kiki?

Funguei.

- É claro – respondi, dando de ombros, enquanto ia para o banheiro do dormitório trocar de roupa. Voltei, com sentada em cima da cama, como se me esperasse para uma longa e chata conversinha feminina. Ignorei, coloquei meu tapa-olho de dormir e me joguei na cama, enfiando a cara embaixo do travesseiro.

***

- Bom dia, Kiki! – ouvi uma voz esganiçada exclamar, bem próximo ao meu ouvido.

- Vai se ferrar – grunhi, virando para o outro lado. Já mencionei que não sou uma pessoa que gosta de ser acordada?

riu, e eu voltei a dormir.

- Você vai perder o café! Você não pode perder seu primeiro café em Hogwarts, tem quitutes deliciosas!

Ok, certo. Esta foi a gota d'água. Não dá para discutir com alguém que diz coisas absurdas como 'quitutes'.

Isso é tosco.

Esse pessoal precisa de uma aula de língua inglesa do século XX.

Perâ!

Eles - e eu - estão no ano de 1944, então estamos no século XX.

Então deixa eu raciocinar o certo:

Esse pessoal tá precisando de uma aula de língua inglesa da década de noventa.

Levantei bruscamente da cama, fazendo com que desse um sorrisinho vitorioso. Me arrastei até o banheiro e me enfiei na primeira roupa que vi dentro do meu malão, e desci de pantufas mesmo.

- Animada para o seu primeiro café? Você vai adorar, estou certa disso! – ia piando a , enquanto eu tentava fingir que não ouvia.

Se não tiver aquele suco de abóbora diabólico talvez eu adore mesmo.

Chegamos no Salão Principal, que já não estava mais tão cheio, e nos sentamos na parte da sonserina.

Quando olhei para a mesa, entendi sobre o que a estava falando. Tive que me segurar para não botar um pouco de tudo no prato.

Você sabe, se eu conseguir terminar essa missão e ser a heroína do mundo e tudo mais, não dá pra ser uma heroína gorda.

- Ora, ora. Achei que não fosse ter coragem para sair do quarto – ouvi uma voz arrastada dizer atrás de mim, logo na hora que eu ia enfiar um bolinho cheio de açúcar na boca. Olhei para trás e dei de cara com Devon, que me olhava cheio do ódio, e tossi.

Me perguntei brevemente se Dumbledore não tinha errado, e se na verdade era Devon que ia se tornar um lorde das trevas. Porque aquele cara me fazia tremer. Sério.

De qualquer forma, a tosse fez com que o açúcar voasse para minha cara, fazendo com que eu parecesse mais patética do que provavelmente já estava. Com as pantufas e tudo o mais.

- Adorável – zombou o demôniozinho em forma de Mister Sonserina – Acho que temos uma conversinha para terminar, Beauxbatons.

Aí puxa vida. Eu não mereço.

Pelo menos eu podia agradecer por duas coisas: Tom Riddle não se encontrava naquela mesa, e nem o suco de abóbora. Talvez Merlin ainda gostasse de mim. Um pouquinho sabe? Nada exagerado.

Infelizmente.

- Não sei do que você está falando – respondi, cheia de açúcar na cara. O que provavelmente tornava meu tom muito menos ameaçador.

- Eu acho que você não está entendendo... – começou Devon, se aproximando - ... a gravidade da situação.

Gente. Ele acha o que, que está num filme de gangster?

- "Eu acho que você não tá nhé nhé nhé" – imitei, fazendo uma voz fina idiota.

Ok, ninguém declarou que precisava ser uma discussão madura.

- Eu ouvi isso – grunhiu ele.

- Esse era o objetivo.

A veia na têmpora dele começou a pulsar de novo. Ele se aproximou mais ainda quando alguém disse:

- Srta. Schiffer?

Olhei para o lado, notando que toda a mesa da Sonserina estava nos encarando. Senti minha bochecha corar enquanto olhava para a mulher que havia me chamado, que era provavelmente uma professora, ou uma aluna com sérios problemas de envelhecimento precoce.

- Oie, sou eu – respondi.

- Diretor Dippet pediu para que eu te levasse ao escritório dele, agora mesmo.

Sorri. Salva pelo gongo.

- Claro! Já estou lá, segure as pontas só um segundinho, vou só pegar esse bolinho para terminar de comer – disse, enquanto pegava o bolinho açucarado.

Antes de me levantar, olhei para Devon, que parecia altamente propício a cometer um assassinato a qualquer momento.

A mulher assentiu com a cabeça e foi indo na frente, enquanto eu saía da mesa.

- Por que você saiu de Beauxbatons, afinal? Deveria ter ficado na sua terrinha – rangeu Devon.

- Expulsa por excesso de uso de magia negra – menti, dando um sorrisinho falso – Até logo!

E, pela segunda vez, fui embora antes que ele pudesse dizer algo.

Capítulo 6 – Dividindo aposentos com o inimigo.
A mulher me levou até a estátua que se transformava na escada que me levaria direto à sala de Armando Dippet, e se mandou.
Subi os degraus me perguntando o que diabos aquele homem queria comigo. E se ele perguntasse motivos da minha transferência? Coisas da minha vida pessoal? Poxa eu não tinha preparado nenhuma história ainda. Dumbledore tinha que ter resolvido isso!
Eu sou somente a garota que tem que matar a versão mine mais mesmo assim diabólica do Voldemort.
Mas, bem, se eu achava que a coisa ia pegar para o meu lado, depois de ver Tom Riddle sentado na cadeira em frente à mesa do diretor eu tive certeza.
Ah meu Merlim. Dippet descobriu minha missão e vai me dedurar para Riddle, e os dois vão fazer churrasquinho de mim. Oh Merlim. Oh Merlim. Oh Merlim. Oh Merlim.
Me dei mal.
- Srta. Schiffer. Está atrasada, estamos te esperando há uns bons dez minutos – disse o dedo-duro Dippet. Riddle me olhava com a sobrancelha erguida, mas sem demonstrar qualquer tipo de emoção. Talvez ele não soubesse ainda. Talvez eu ainda tivesse tempo para fugir e me esconder no Afeganistão, eles ainda não tinham começado a se matar não é?
- Foi mal, a Sra... hã... você sabe, aquela mulher só me chamou agora – respondi, com a voz meio tremida – Estava tomando café da manhã, trouxe esse bolinho, alguém quer? – ofereci, estendendo o bolinho para Dippet e depois para Riddle, quase sujando o nariz perfeito dele de açúcar.
Como nenhum dos dois pareceu aceitar, dei uma mordida nele.
Não no Riddle, no bolinho.
- Sente-se por favor, Srta. Schiffer – disse o diretor, parecendo meio chocado pelo meu uso de vocábulos como "foi mal", e pela oferta de um bolinho meio mordido.
Qual é?! Eu não babo.
Me sentei quase que roboticamente na cadeira ao lado de Riddle. Droga, como ele era bonito. A luz da janela entreaberta batia nos olhos dele, fazendo com que as íris cinzas grafites, normalmente escuras e frias, parecessem mais claras e... bem, com vida.
Respirei fundo e esperei Dippet explicar toda minha missão para o Mini Voldy, mas ao invés disso ele disse:
- Chamei vocês dois aqui hoje para falar do cronograma dos monitores. Está sendo preparado e estará aqui em minha sala na sexta-feira, quando vocês deverão vir buscar. Mas estejam preparados para uma carga horária pesada, este ano será bem movimentado – tagarelava o diretor, enquanto eu me encolhia na cadeira. Tinha esquecido dessa minha função de Monitora Júnior. Bem, pelo menos ele não tava me difamando na frente do Lordezinho – E tentem ficar vigilantes o tempo todo, não queremos que os eventos de um ano atrás se repitam.
Eventos?
Ah, sim! Ahh, eu sabia bem do que eles estavam falando. Fiquei sabendo da artimanha do Tom Serial Killer Riddle.
Mas, bem, pelo menos eles não sabiam que eu sabia.
- É claro – respondeu Riddle, como sempre manuseando sua voz para que ficasse em um equilíbrio perfeito entre cortês e desinteressado. Ele estava sentado em uma postura perfeita, com as mãos tranquilamente apoiadas nas pernas.
Esse cara é um absurdo, parece um boneco, até a postura dele é perfeita! Céus, eu estava sentada que nem um homem das cavernas, completamente curvada, e ele parecendo um tronco de árvore.
"É claro", mas que mentiroso asqueroso, sonso, cínico...
Aí puxa, tenho que me fazer de sonsa também.
- Que eventos? – perguntei.
Dippet arregalou os olhos, e começou a mexer nas vestes nervosamente.
- Ah se eu tivesse tempo Srta. Schiffer... se eu tivesse tempo, não hesitaria em lhe responder, mas estou certo de que você percebe que eu tenho um trabalho muito importante, eu tenho uma escola para dirigir e um encontro com o Professor Dumbledore em dez minutos que não pode esperar.
- Ah... – fiz, enquanto dava uma nova mordida no bolinho que parecia ser muito mais saudável que olhar para a cara do Dippet-pseudo-de-múmia.
- Por que você não explica tudo para a Srta. Schiffer, Sr. Riddle? – sugeriu o diretor.
Há! Essa eu quero ver!
Os olhos de Riddle, que antes pareciam distantes e entediados, piscaram em alerta e se estreitaram.
- Sr., você não acha que seria melhor que ela ouvisse de alguém como o senhor...
- Oh, de jeito nenhum, de jeito nenhum. Você é o Monitor Chefe, tenho certeza que fará um ótimo trabalho – começou Dippet, feliz por ter se livrado do fardo – O que me faz lembrar de outro detalhe! Como a Srta. Schiffer é nossa nova Monitora Júnior, sugiro que vocês dividam o dormitório do Monitor Chefe. Vocês terão quartos separados, é claro, mas dividirão todo o resto.
- O quê? – piei, com mais desespero na voz do que deveria ter, quase cuspindo o pedaço de bolo que estava em minha boca.
Não é possível. Dippet deve ter minhoca na cabeça ao invés de cérebro. Como ele espera que eu compartilhe um aposento com Lord Voldemort e saia de lá viva?
Ou sem ter ficado louca mentalmente e traumatizada?
Mas vou te contar, Riddle não parecia muito feliz também não. Não que desse para ler muitas expressões naquela cara ridiculamente apática, mas eu sentia que ele estava incomodado.
Ou talvez ele nunca tivesse divido um cômodo dessa maneira com alguma garota.
Nossa, que surpreendente.
OU, OU, OU talvez ele seja boiola.
Porque, o Dumby do futuro nunquinha me falou de algum caso do Vol Vol.
He he.
DESCOBRI O SEU SEGREDO TOM RIDDLE.
Certo, parei. Mas a ideia é realmente considerável.
- Senhor, você realmente acredita que isso é uma b... – começou Riddle, mas foi interrompido enquanto Dippet se levantava.
- Já foi tudo decidido, Sr. Riddle. Já está tudo lá, preparado. Agora se me dão licença, tenho uma reunião para comparecer. Até mais! – ele foi dizendo, praticamente nos empurrando para fora. Quando ouvi a porta se fechar atrás de mim, me senti uma adolescente de quinze anos sendo expulsa de uma boate para maiores.
E, novamente, lá estava eu, sozinha e indefesa, em um corredor estreito, com o futuro Lorde das Trevas.
"Ok, certo. Você tem que se acalmar. “Ele não vai te matar em frente à sala do Diretor", eu dizia para mim mesma.
Mas, puxa, era muita informação para assimilar. Dividir um dormitório com Tom Riddle? Isso me cheirava a Dumbledore.
Ele queria o quê, que eu seduzisse o “Lord nhé nhé nhé das Trevas”?
Quando olhei, vi que ele já havia começado a andar, sem nem ao menos fingir que estava me esperando. Dei um pulinho para alcançá-lo. Acho que ele achou isso ridículo.
- Você acha que fomos embora muito cedo? Ele parecia estar gostando tanto de nossa companhia! – brinquei, dando um sorrisinho bobo.
Mas, ao invés de responder, como faria qualquer pessoa normal, ou dar uma risadinha, ou sequer concordar, Riddle me encarou como se não me entendesse e, um segundo depois, virou as costas e saiu andando, com a capa das vestes balançando dramaticamente atrás de si, parecendo o Conde Drácula.
“Wow. Isso era pra ser uma piada”, pensei.
Fiquei encarando suas costas por alguns segundos, sem acreditar que alguém poderia ser tão incrivelmente grosso como Tom Riddle.
“Ok, então não me responda”, pensei, irritada.
- Ei! – chamei, e dei uma corridinha de novo para alcançá-lo, sem saber direito o que estava fazendo – Dippet é sempre assim?
- Sempre assim como? – ele perguntou, naquela voz completamente desprovida de qualquer emoção, sem desacelerar o passo.
Séria muita paranoia minha pensar que ele ensaia essa voz?
- Todo tipo "Oi, eu sou o máximo, vamos terminar logo a conversa para eu poder tacar vocês para fora da minha sala e continuar a me auto admirar".
Juro que por um segundo achei ter visto um sorrisinho se esboçar no rosto dele, mas quando ele se virou para me olhar apaticamente, percebi que devia ter sido impressão minha.
- Geralmente. Se você tivesse feito o favor de chegar na hora, talvez a reunião tivesse sido mais calma – ele disse acidamente, seu olhar sombriamente investigando meu rosto – Não concorda?
- Bem, me desculpe se além de ser brilhante o suficiente para ser nomeada Monitora, eu também tenho vida social – respondi, mordaz.
Comecei a duvidar se alguma vez conseguiria manter uma conversa amigável com o Dark Lord. Sem chamá-lo de patético ou anti-social, eu quero dizer.
Ele não respondeu, apenas continuou andando. O que não foi nenhuma surpresa.
Cheguei à conclusão que devíamos estar indo para nossos novos 'aposentos', pois chegamos a uma porta onde havia um enorme quadro com um cavaleiro sentado tediosamente em um cavalo, que deveria ser o 'guardião' do dormitório, ou algo do tipo.
Riddle parou em frente à pintura, fazendo com que o cavaleiro se levantasse do cavalo e fizesse uma reverência.
- Bom dia, Sr. Riddle! – exclamou o cara.
- Sr. Cadogan – falou Riddle, friamente. Não é a toa que ele ficou com a pele de branca e cara de cobra, puxa.
- Senha?
Riddle revirou os olhos. Aparentemente se irritava com o fato de alguém ter a audácia de lhe pedir uma senha, sendo que ele morava naquele dormitório desde quando fora nomeado Monitor Chefe.
- Tempo.
- Muito bem, bom senhor, muito bem! – declarou Sr. Cadogan, solenemente. A porta se abriu lentamente, fazendo um 'creek' irritante daqueles de portas abrindo em filme de terror.
Riddle estreitou os olhos para Sr. Cadogan e seguiu em direção a entrada, e fui indo logo atrás.
- ALTO TÁ, seu patife, alto lá! – exclamou Sr. Cadogan, tão repentinamente que eu dei um pulo de quase um quilômetro para trás e completei com um berro.
Riddle, por outro lado, sibilou alguma coisa maldosa em um tom quase inaudível, e cruzou os braços, encarando friamente o cavaleiro descontente com seus olhos cinzas grafites super sedutivos tempestuosos.
- Temos algum problema? – ele perguntou numa voz fumegante, que era muito assustadoramente calma para ser calma. Se é que isso faz algum sentido.
- Conduta nada cavalheira, eu diria! Nada cortês! Vergonhoso – piava Sr. Cadogan, balançando as mãos furiosamente – Damas primeiro, seu intrujão, as damas sempre entram primeiro!
Não aguentei e comecei a rir. Muito. De dar aqueles roncos de porquinho.
E, sem pensar muito, mandei:
- Então, devo ir primeiro ou você vai?
Ok, não foi a coisa mais sábia que eu já disse. Mas era uma oportunidade perfeita para fazer essa brincadeira. E eu não sou muito boa em controlar impulsos.
Riddle parecia completamente pego de surpresa pela minha piadinha, não dando tempo de pensar em alguma reação assassina, o que provavelmente me salvou.
Depois disso, nenhum dos dois tentou entrar. Ficamos em pé num silêncio ridículo, que dava até pra ouvir o som do vento vindo de uma janela próxima.
O cara, por sua vez, começou a me estudar por quase um minuto. Instintivamente, levantei meu queixo e ajeitei meu cabelo relutantemente diante de seu scan laser, e aproveitei para escaneá-lo também, tentando achar ódio, raiva, ou pelo menos irritabilidade em sua cara, mas incrivelmente achando... bem, nada.
De qualquer forma, por mais que ele estivesse demonstrando um monte de nenhuma emoção, eu sabia que ele tinha que estar pensando em alguma coisa naqueles sessenta segundos. Mas não dava para saber o quê. Não dava mesmo.
Mas dava para entender porque os outros alunos e até professores o rondavam com a maior cara de nervoso e medo.
Instintivamente meti a mão no meu bolso, encontrando minha varinha, e a segurei.
Não pude deixar de sentir um enorme alívio quando o vi dar um passo para trás, ridiculamente longe da porta de entrada, dizendo:
- Oh não, eu não sonharia em obstruir o caminho da realeza de sangue-puro, Schiffer – ele estendeu a mão para a porta – Vá em frente, eu insisto.
Tenho alguns comentários a fazer sobre isto:
a) Aonde é que ele arranja esses vocabulários?
b) Ele acabou de ridicularizar sangue-puro?
c) Será que ele decora todas as famílias bruxas que tem sangue-puro? Nem eu sabia que esse sobrenome era de uma família sangue-puro. Caramba.
- Quanta atenciosidade da sua parte – respondi, entrando.
Puxa, aquele lugar era mesmo bonitinho. Se não fosse o fato de eu ter que dividí-lo com o Riddle, que provavelmente me matará enquanto eu durmo, eu não podia pedir por lugar melhor. Logo na entrada havia um sofazinho em frente à lareira, e logo ao lado havia uma mesinha. Atrás estavam as portas que provavelmente levavam ao meu quarto e ao dele, e no meio uma porta que provavelmente levava ao banheiro.
Não, não. Espere aí. Um banheiro só?
Um banheiro só?
Só pode ser brincadeira.
Ok. Se concentre.
Tudo bem, as coisas não haviam começado muito bem entre Riddle e eu. Mas se eu realmente esperava descobrir alguma coisa remotamente interessante sobre o jovem Lord Voldemort, decidi que iria ter que criar algumas regras.
- Se liga, Riddle – disse, quando vi que ele já tinha entrado no estabelecimento – Nós vamos ter que trabalhar muito juntos esse ano, então a não ser que você queira que a gente se estrangule até o fim dos 365 dias, sugiro que a gente chegue a algum acordo comunicativo que possa funcionar.
Riddle, que não tinha parado de andar desde quando entrou na sala, parou na porta de seu quarto. Do jeito que as coisas andavam, eu estava esperando que ele me mostrasse a língua e entrasse no quarto ou algo do tipo, mas surpreendentemente ele se virou e disse:
-Schiffer, eu acredito que esta foi a coisa mais inteligente que você disse desde que nos conhecemos.
O assustador era que ele realmente parecia achar isso.
Me dirigi até a mesinha que tinha perto do sofá e me sentei ali em cima, ainda olhando para Riddle.
- Certo. Eu já consigo ver um problema. Eu sou tagarela e você não. Ok. Por alguma razão louca você me conheceu, e me odiou completamente. Tudo bem. Sem ressentimentos. Consigo lidar com isso. Mas isso não nos ajuda a descobrir como tolerar um ao outro o suficiente para fazer essa escola seguir seu rumo.
Riddle não tinha se movido de seu lugar em frente à porta, mas estava agora passando a mão pelos seus cabelos negros e perfeitamente arrumados.
- Certo, Schiffer, é isso ou nada – ele explodiu, parecendo irritado – Eu não poderia me importar menos com o que você faz ou não. Entretanto – ele pausou, dando ênfase à palavra "entretanto" – Eu vou pedir para que nossa sala comunal seja usada para assuntos oficias apenas, e não para encontros sociais nos que você aparentemente prospera tanto. Isso te satisfaz?
Esse senso de humor ridículo dele está começando a me dar nos nervos.
- Ótimo. Talvez funcione – respondi, pulando para fora da mesinha.
- Ótimo – disse o Herdeiro da Sonserina, abrindo a porta do seu quarto – Foi um prazer trabalhar com você, Schiffer. Preferivelmente, não teremos que fazer isso de novo tão cedo.
- Até loguinho! – Gritei animadamente, enquanto a porta dele fechava num estrondo – Babaca.
Capítulo 7 – Um banheiro, uma visão, e um lorde.
- Bom dia, K! – exclamou uma voz atrás de mim muito alta e fina, que quase fez com que eu cuspisse o pedaço de torrada que havia acabado de botar na boca.
- Bom dia, – respondi com a boca cheia à , que se sentava ao meu lado na mesa da Sonserina. não havia desistido de ficar no meu pé, e há quatro dias eu estava andando bastante com ela. Bom, pelo menos eu tinha feito algum amigo. Além do elfo Felix, que eu visitei toda noite em busca de algo que saciasse minha sede e não envolvesse abóboras.
Quanto ao Devon, nunca mais o vi depois daquele dia. O que é um certo alívio, porque juro que acho que na próxima vez que nos esbarrarmos, ele vai tentar arrancar minha cabeça ou algo do tipo.
E Riddle, bem, raramente o via. Ele aparentemente nunca se alimentava, já que eu nunca o encontrava nas refeições, e não cruzei com ele uma vez sequer no dormitório, a não ser esta manhã, o que foi bem desagradável se você quer saber.
Vou contar como foi.
Manhã ensolarada de sexta-feira, acordo com meu típico bom-humor matutino e saio do meu quarto de pijama e pantufinhas e com uma juba de dar inveja à um leão, visando ir até o banheiro.
Qual foi minha surpresa ao abrir a porta e ver o Sr. Postura Perfeita em pé, já devidamente vestido, cabelos molhados do banho e perfeitamente ajeitados, me encarando.
- Hoje é sexta. Temos que buscar nossos cronogramas.
- Tá falando comigo?
Riddle franziu o cenho, como se tivesse se arrependido imediatamente da decisão de estabelecer algum contato comigo.
- Sim – grunhiu, com acidez – Para meu desagrado, certamente.
Há há. Se ele não virasse o rei das trevas, poderia ser comediante.
- Hm. Tô sabendo que dia é hoje, obrigada por avisar. Agora se me dá licença, vou tomar banho - disse, enquanto me dirigia ao banheiro.
Riddle crispou os lábios tão vêementemente que parecia que ele nem tinha mais lábios.
- Me encontre na biblioteca às oito, para irmos buscar – disse, com os dentes trincados.
- Por que eu deveria... – comecei, mas parei ao ver que, logo assim que ele notou que eu ia voltar a falar ele se virou e saiu – babaca.
Terminei de comer minha torrada com geléia de abóbora (a geléia era boa, diferentemente do suco), e tomei o último gole da minha água, antes de dizer:
- Pamy, acho que já vou indo. Tenho que encontrar o Riddle na biblioteca às oito – expliquei, já me levantando.
- Mas são sete e meia ainda! – disse .
- É, eu sei, mas eu quero aproveitar para ir ao banheiro, estou tão apertada que posso explodir – esclareci. Ela assentiu a cabeça, entendendo minha situação, e eu dei o fora.
Fui andando pelo corredor do primeiro andar, tentando me lembrar onde havia a droga de um banheiro. Merlim! Por que eles não entregam uma droga de um mapa para os alunos novos? Ou não colocam algumas placas indicando os locais importantes, como banheiros, salão principal, etc, que nem nos Shoppings trouxas?
Acelerei o passo, tentando desesperadamente achar algum toalete.
Toalete?
Estou passando tempo demais com esse povo, tô até falando as palavras formalmente ridículas.
Finalmente, finalmente, achei uma porta que devia dar a um, e corri para alcançá-la.
Mas, como minha sorte não é das melhores, logo vi a indicação de que era um banheiro masculino.
Ahhhhhhhhh...
Olhei para os lados. Corredor vazio.
Bem... ah, quem se importa.
Alegre com minha decisão, tentei abrir a porta, mas estava fechada.
- Ocupado! – ouvi uma voz lá de dentro dizer. Droga. DROGA!
VOC É UM HOMEM! Pode ir fazer suas necessidades no jardim ou atrás de uma estatua, por Merlim!
Tem caras que fazem isso no meio da rua! DROGA!
Não dava para arriscar a procurar o feminino. Se eu me movesse muito, minha bexiga não ia aguentar. Diabos. Essa escola não tem lógica alguma. Pra quê, santo Merlim, não botar os banheiros femininos e masculinos um do lado do outro igual aos restaurantes?
Ah, esqueci. Infelizmente não estou na década de 90, mas sim trancafiada á ter que matar um ser meio humano, meio robô.
Não me restava opção além de esperar. O cara devia estar apenas fazendo um xixizinho. Não iria demorar.
Cara. Como eu estava errada.
Ele não saía de lá nunca. Ou estava com sérios problemas intestinais (inturido), ou estava me sacaneando mesmo.
Com o desespero aumentando, comecei a dar pulinhos, cruzando as pernas, sentindo que eu podia morrer a qualquer momento.
Ok, estou exagerando.
De qualquer modo, logo quando eu estava praticando a patética dança do Segure-Seu-Xixi, ouço uma voz arrastada atrás de mim dizer:
- Olá, Beauxbatons.
Ótimo. Devon. Espero que ele me mate logo, assim meu sofrimento terá fim.
Olhei para trás, e dei de cara com aquela figura loira, que me encarava com um sorriso sarcástico.
- Hmmm, oiê – falei, parando de pular.
- Tem alguém lá dentro? – ele perguntou.
- Ah não, estou só fazendo aquele jogo "espere até o último segundo até você explodir e morrer"!
Devon ergueu as sobrancelhas e estreitou os olhos amendoados, depois cruzando os braços fortes.
- É o banheiro masculino, Beauxbatons – explicou ele.
- É, bem, eu não ligo – retruquei. E era verdade.
Devon revirou os olhos em desprezo e se aproximou de mim, fazendo com que eu me sentisse uma anã. Droga, como ele era alto.
Logo depois ele se virou para a porta e começou a socá-la.
- ACELERA AÍ, ZÉ MANÉ! – urrou para o cara que estava dentro do banheiro há séculos.
Putz.
Olhei para cima para encará-lo. Isso que eram modos.
- Sua delicadeza me impressiona – murmurei, enquanto ouvia o delicioso som da porta destrancando.
- Não te perguntei nada – retrucou Devon. Logo depois, a porta se abriu e um garoto que devia ser do terceiro ano saiu, praticamente correndo.
Dei um passo a frente para entrar no meu almejado banheiro quando o braço enorme do Devon me parou.
- Onde você está pensando que vai? Vá procurar seu banheiro – disse ele.
Senti meus olhos se enxerem de lágrimas. Sério. Ele não tinha idéia do QUANTO eu precisava daquele banheiro.
- Devon, você NÃO vai na minha frente! – praticamente gritei, numa voz ultrassônica.
Ele riu. Riu. Ahhhhhhh, como ele vai se arrepender.
Ergui minha mão e cravei minhas unhas no braço dele que me impedia de entrar no paraíso. É isso aí. Ninguém mandou se meter comigo.
Ele deu um gemido supreendentemente femino e tirou o braço da minha frente no mesmo segundo, e eu aproveitei para entrar depressinha.
Hihihi. Olá, banheirinho lindo e cheiroso!
Envolvi o vaso sanitário com papel higiênico (cara, era um banheiro masculino, tipo, meio eca, apaga o “cheiroso” da sua memoria, please) e sentei.
Ahhhhhhhh, que alívio.
Meu alívio foi tão grande, que por um momento até esqueci que eu tinha deixado um Devon enfurecido do lado de fora, que provavelmente estava esperando para estourar meus miolos ou coisa pior.
Por isso quando terminei de lavar as mãos, abri a porta e dei de cara com a ponta de uma varinha que estava apontada diretamente para minha cabeça, eu levei um susto.
Ai, Merlim.
O que eu faço? Pego minha varinha também? Começo um duelo?
Não, talvez isso não fosse uma boa idéia. Quero dizer, meus conhecimentos mágicos estão muito além de uma estudante do sexto ano, e eu não queria trazer desconfianças. Muito menos do Loiro Assassino aqui.
Por isso, tomei a providência mais adequada e sábia de todas.
- Seu cadarço está desamarrado! – exclamei esfregando meu dedo na frente de sua cara e apontado para baixo.
Ele franziu o cenho como quem me achava muito idiota, e eu, aproveitando este momento de fraqueza, agarrei a varinha dele e saí correndo.
Não olhei pra trás um segundo sequer. Acho que ele ficou tão consternado com minha brilhante estratégia de guerra que nem se deu ao trabalho de me seguir.
Fui correndo, quando de repente me veio uma remota lembrança de que era para eu estar na biblioteca às oito para encontrar Riddle.
Parei e olhei meu relogio. Oito e dez. Com toda aquela confusão, nem me liguei na hora. Puxa, eu estava meio ferrada.
Pensei em quantas vezes uma pessoa podia sofrer ameaças de homicídio antes do almoço.
Acelerei ainda mais o passo, quase derrubando todo mundo que tava no caminho.
Finalmente, cheguei à biblioteca. Sentia que minhas bochechas estavam vermelhas de tanto correr, e meu cabelo devia estar sem explicação. Guardei a varinha do Devon na mochila e olhei no relógio. Oito e quinze. Quinze minutos de atraso. Não quero nem saber o que isso significa no mundo das trevas de Riddle.
Olhei em volta, vendo aquele monte de mesas e estantes e livros que voavam de um lado para o outro, entretanto, não vendo nenhum sinal de Riddle. A biblioteca parecia estar completamente vazia.
Hm. Estranho.
Comecei a andar, dando uma olhada pelas sessões. Nada. Franzi o cenho e acelerei o passo.
Não é possível que ele tenha desistido de esperar e ido embora, é? Porém é mais impossível ainda que ele esteja atrasado também.
Cheguei até a última sessão, sem resultado. Olhei para o lado e vi que nesse corredor tinha uma mesinha perdida bem ao fundo, onde uma pessoa parecia estar sentada atrás de uma enorme pilha de livros.
Claro. Ele não iria sentar num lugar de fácil localização. Tem que complicar as coisas pra coleguinha aqui.
Olhei para a estante, vendo que era a de Artes das Trevas – Defesa e Manutenção.
Faz sentido.
Tipo, daqui a alguns anos ele ira virar um super cara pseudo de cobra, hiper maléfico e demoníaco.
Andei até a mesinha, sem despertar a atenção dele, que parecia estar quase devorando o livro que estava aberto a sua frente, e larguei minha mochila com força na cadeira do lado oposto ao dele, fazendo um estrondinho. O lugar era tão escondido que chegava a ser meio escuro. Dei uma olhadinha pro ser que tava sentado para garantir que era ele mesmo, e não outro obcecado pelas artes das trevas qualquer.
O barulho do material conectando com a madeira fez com que o cara de cabelos negros milimetramente ajeitado piscasse e olhasse pra cima, dando de cara comigo.
- Eu espero que estar sempre deselegantemente atrasada não vire um hábito permanente seu, Schiffer – disse ele, com um leve tom depreciativo em sua voz normalmente cortês.
- Bem, se você tivesse deixado setas na porta da biblioteca com sua localização, eu teria achado você mais cedo – repliquei e, sem ser convidada, me sentei na mesa também – E aí, você vem aqui sempre? – perguntei, num tom de flerte meio ridículo, depois dando uma risadinha.
Ele, que havia voltado às atenções ao livro, reergueu o olhar com o cenho franzido, analisando meu rosto como sempre fazia com uma expressão impossível de ler. Depois de muitos minutos, ele assentiu com a cabeça.
- Então quando você come?
Ele deu de ombros.
- Eu encontro tempo – ele disse indiferente, fechando o livro (que devia ter pelo menos uns dois milhões de anos) com um baque forte, fazendo com que voasse um pouco de poeira para o meu nariz, e jogando-o rapidamente em sua mochila.
“Hm, isso explica porque ele nunca está no Salão Principal”, pensei, enquanto coçava o nariz.
Depois disso, ele tirou uns pergaminhos da mochila e empurrou para mim. Era o horário das monitorias. Ele já tinha pego!
Bem, isso ia me economizar de subir muitas escadas.
Nem me dei ao trabalho de agradecer – como se ele merecesse, não fez mais do que a obrigação – e comecei a dar uma lida.
Hmmm. Chatice, chatice, chatice. Dippet realmente queria que eu perdesse todo meu sono rondando o castelo.
Já estava bolando planos para burlar os horários quando me senti observada. Desviei meu olhar dos horários e encontrei o olhar de Riddle. Pude jurar que o olhar dele era de quase de diversão atrás de seus olhos acizentados apáticos.
- Quê? – perguntei.
- Você está anormalmente rabugenta hoje, Schiffer. Nenhum 'bom-dia, como vai?'.
Revirei os olhos. Ok, minha manhã já estava suficientemente ruim, não estava afim de participar de qualquer joguinho estúpido que ele estivesse fazendo. Peguei o pergaminho que estava embaixo do meu horário, e entreguei pra ele, falando:
- Esse aqui é seu, muito obrigada, e não me venha com discursos sobre educação, Sr. Eu-Não-Faço-Formalidades.
Riddle ergueu uma das sobrancelhas, enquanto me escaneava.
- Bem, pode ficar calma Schiffer, porque eu não tenho a menor intenção de fazer tal coisa – ele afunilou o olhar – A esta altura, alguém tão grosseiro quanto eu jamais sonharia alcançar seus altos padrões de etiqueta.
Merlim. Ele tem uma respostinha engraçadinha para tudo, não tem?
- Sabe o quê? Por mais inteligente e espirituoso que você inegavelmente seja, Riddle, eu não gosto de ser ridicularizada. Então vamos parar de perder nosso tempo com suas piadinhas.
Certo. Minha missão sempre fora impedir que Tom Riddle se tornasse Lord Voldemort, seja lá quais medidas fossem necessárias. Eu estava querendo ir por um caminho mais pacífico, pra ser sincera. Como tentar mudar a cabeça dele, desviá-lo do caminho do mal, etc etc. Mas se matá-lo fosse a única saída, por mais que as vozes em minha cabeça dissessem que isso era terrivelmente errado, eu teria que considerar esta opção também.
E ele tava ajudando muito a me tender pra esse lado.
Ficamos em silêncio. Riddle aparentemente perdeu o interesse em qualquer coisa relativa a mim e abriu o pergaminho com seus horários, escrevendo sei lá o quê neles, e eu fiz e desfiz diversas vezes uma trança no meu cabelo.
- Que eventos? – perguntei, repentinamente. Me veio à cabeça aquela conversa na sala do diretor, e a pergunta saiu da minha boca antes que eu pensasse melhor.
Os olhos de Riddle se mantiveram fixos nas páginas amareladas. Minha perguntinha não pareceu perturbá-lo nem um pouquinho.
- Quê? – ele perguntou, finalmente, parecendo distraído.
- "Não queremos que os eventos de um ano atrás se repitam" – falei, citando o que Dippet havia dito naquela reunião, depois cruzando os braços enquanto esperava por uma resposta.
Riddle ergueu os olhos, afastou um pouco a cadeira e esticou os braços, parecendo completamente despreocupado. Ele era um ótimo ator. Devia seguir essa carreira.
Talvez ele conseguisse o papel do carinha de Jogos Mortais, ou quem sabe Sexta-feita 13. Sei lá. É só uma ideia.
- Você realmente aparece com as coisas mais aleatórias, Schiffer.
Estreitei os olhos, deixando claro que eu não ia largar esse assunto tão cedo.
- Não tão aleatórias assim – resmunguei.
Eu ainda tentava ler sua expressão enquanto ele me encarava sem emoção, mas era impossível. O cara escondia tudo com perfeição.
- Me parece que ao invés de terminar de uma vez esse trabalho com os horários para passarmos o menor tempo possível juntos, você é quem está saindo significantemente do assunto... – começou ele.
Ahhh, você não vai se livrar dessa, Tom Lord Voldemort Riddle!
- Desculpe se eu estiver errada – interrompi – mas qualquer coisa que tenha a ver com o bem-estar dessa instituição parece bem dentro do assunto para mim – falei, agarrando o pulso dele antes que ele voltasse a escrever...
... e soltando antes que você possa dizer 'ai'.
Dessa vez, eu tive certeza que vi um flash de alarme passar momentaneamente pelos olhos azuis de Riddle. Ele levou as mãos para trás numa rapidez incrível, com a respiração parecendo acelerar - não a ponto de ser notável, mas como eu estava prestando atenção a qualquer movimento dele, eu percebi.
E isso com certeza era porque ele estava se lembrando da última vez que nos tocamos.
E com razão.
Hihihihi. Até que isso vai me servir bem.
Riddle me encarava intensamente, como se estivesse na expectativa. Comecei a girar os olhos e parecer sonolenta.
- Tinha uma câmara... câmara... câmara silênciosa? – comecei, tentando imitar as videntes que eu já vi em feiras lá na França.
Olhei para ele com o canto do olho, e ele estava com a sobrancelha erguida, sem dúvidas achando que eu havia simplesmente pesquisado alguma coisa sobre os tais eventos e que estava agora apenas aprontando um showzinho.
Bem, eu posso não ser boa atriz como ele, mas eu tinha certamente muito mais informações do que ele achava!
- Secreta – ele corrigiu finalmente, numa voz baixa e equilibrada.
- Sim... sim... isso... Câmara Secreta – divaguei, fechando os olhos como se fosse para continuar vendo as imagens – Havia algo... algo dentro da Câmara! Era orientado pelo ódio... – eu me sentia muito ridícula a cada palavra mas, ei, faz parte do serviço – Mate, mate os sangue-ruins! – tentei forçar a minha voz para ficar mais grossa do que a minha própria.
Reabri os olhos, tendo que fazer uma força que você nem imagina para não começar a rir desesperadamente ali mesmo com o olhar estreito de Riddle, que ia de suspeita até descrença.
- Uma garota... uma garota morreu! – continuei, completamente agradecida ao pessoal da Ordem que deu todos os detalhes sobre o assunto para nós – Ela estava em um banheiro... e... havia olhos enormes e brilhantes... uma cobra gigante! Merlim, era enorme! – não pude evitar de dar um sorrisinho, sabendo que a próxima informação eu só poderia ter obtido, hipoteticamente, do próprio herdeiro da Slytherin – e tinham canos... um buraco gigante no meio de um monte de pias. Hm, isso é estranho... espere! Ela abriu!
BOOM!
Riddle lançou sua mochila em cima da mesa, me acordando do 'transe psíquico'. Enquanto eu pulava de susto, ele apontou para o meu relógio.
- A hora, Schiffer. Nove e dezessete. Se você enrolar mais, não vai poder exibir suas boas maneiras pelos corredores.
Certo. É isso aí. Eu já tive o bastante de Riddle e seus comentários bonitinhos!
Me levantei bruscamente e apertei a mandíbula, cheia de ódio. Me apoiei na mesa com uma das mãos e com a outra apontei para o meio da cara dele.
- Escuta aqui, senhor engomadinho! O que eu faço ou deixo de fazer não é nem remotamente da sua conta, e, imagine só!, Eu não sou a morena burra que quer aparecer e comprou o cargo de Monitora que você parece achar que eu sou.
- Não? – perguntou Riddle, com as duas sobrancelhas erguidas, desperturbado, enquanto ele inclinava sua cadeira para trás, pra evitar que eu furasse seu nariz com o dedo.
Creio levemente na ideia que ele também ensaia esse troço das sobrancelhas no espelho.
- Não! – grunhi, levantando minha mochila e pendurando-a nas costas – E estava certo, não estava? – perguntei, antes de me mandar – A Câmara Secreta, a garota morrendo no banheiro, eram esses os 'eventos' aos quais Dippet estava se referindo, não era, Riddle?
Por mais que seu rosto não demonstrasse qualquer emoção, eu podia perceber que ele estava sentado bem mais rígido e bem menos relaxado do que quando eu entrei na biblioteca. Ele investigou minha expressão por alguns segundos – com o que eu já estava começando a me acostumar – e eventualmente disse, numa voz baixa:
- Dez pontos para a Sonserina por sua... exibição perturbadoramente exata, Srta. Schiffer.
Com essa estranha maneira de reconhecer que eu tinha acertado, foi a minha vez de erguer as sobrancelhas. Mas eu sabia que Riddle tinha que agir, nem que fosse pra evitar que eu saísse contando pras pessoas da minha 'visão'. Ele tinha que agir como se tudo aquilo fosse do conhecimento de todo mundo.
O que definitivamente não era.
- Certo, hm, te vejo por aí – falei, num tom que eu imaginei que fosse desinteressado, girando nos calcanhares e dando o fora dali, com um sorrisinho.
Eu merecia um troféu por isso.
Capítulo 8 – Um Santo Diabólico.
- BEAUXBATONS!
Devon entrava no Salão Principal parecendo um trovão enfurecido. Ele galopou( é, ele galopou) até chegar onde eu estava sentada, parando em frente a e eu. A gente estava tomando café da manhã na inocência, até ele aparecer todo maluco e enfurecido.
Quando ele parou, eu engoli em seco. Porque ele estava sem o casaco do uniforme esta manhã, estava apenas com a camisa, com as mangas dobradas até acima do cotovelo.
O que mostrava o quão grande era o braço dele. Ele podia me transformar em churrasquinho com aquilo numa rapidez incrível.
- Hmmmmm, bom dia – falei, de repente me sentindo muito intimidada por aquelas toras vermelhas que estavam no lugar do braço dele.
- CADÊ. A MINHA. VARINHA? – ele indagou, pausadamente, praticamente cuspindo fogo.
me olhava com curiosidade. Assim como todo o resto do salão.
- Não sei do que você está falando – respondi, pegando uma torrada para passar geléia. Eu precisava desviar meus olhos dos bíceps dele, de alguma forma.
Devon deu um urro de raiva e se apoiou na mesa, se aproximando de mim.
- Beauxbatons, eu não estou de brincadeira. Me devolva a varinha AGORA ou nós dois vamos ter uma conversinha mais séria.
- 'Ou nós dois vamos ter uma conversinha mais séria blá blá blá' – imitei, fazendo uma voz fina idiota.
Ok, vou te dizer que não me sinto nem à vontade de reproduzir a resposta de Devon aqui.
- Hmm, Kate, você não acha mais sensato devolver a varinha a... – começou , visivelmente temendo pela minha vida. O que não digo que era um exagero dela.
- Não. Ele não a usa com sabedoria – foi a minha resposta, depois olhando para ele e dando um sorrisinho cínico.
Nossa. Devon estava tão explosivo de raiva que só faltava mesmo ele aumentar de tamanho e ficar verde. As pessoas do salão se concentravam em nossa conversa, provavelmente esperando pelo momento que ele me pegaria pelo pescoço e tacaria pela janela.
- VOCÊ NÃO TÁ ESCUTANDO, SUA FRANCESINHA DE MERDA, OU VOCÊ ME ENTREGA A... – ele urrava, sem controle nenhum sobre si mesmo. Eu estava com o olho arregalado, tentando me desvencilhar dos eventuais cuspes que saiam de tanto que ele tava gritando. Medonho. Sério.
- Devon... – começou Pâmela, talvez tentando tomar alguma atitude de proteção a meu favor. Devon ignorou e continuou berrando – Hmmmm, Devon!
- ... A PIOR DAS SUAS DORES E NÃO VAI PODER...
- Malfoy – ouvi uma voz calma dizer, surgindo de não sei onde. Olhei para o lado e vi Tom Riddle erguido ao lado de Devon, com o cenho franzido.
Quando olhei de volta para Devon, vi que ele estava completamente pálido, como se tivesse acabado de ver um fantasma dos feios. Então era isso que estava tentando avisar! Ela deve ter visto Riddle entrando no salão.
Mas por que avisar com tanto nervosismo? Por que Devon parece apavorado com Riddle? E o que ele está fazendo aqui, decidiu finalmente se alimentar como uma pessoa normal? E Malfoy? Devon é um Malfoy? E não tem olhos cinzas?
- Riddle – engasgou Devon, tentando se recompor – Como va...
- Prof. Lestrade pediu que avisasse que o treino do time de Quadribol foi adiado para as quatro horas – interrompeu Riddle. Eu ainda olhava a cena abobalhada – Como capitão, você deve avisar o resto do time – Reparei os olhos cinzas escuros de Riddle se desviarem levemente para a minha direção, mas voltando para Devon milésimos de segundo depois – E pare de gritar, as pessoas estão tentando tomar café-da-manhã.
E, com isso, ele se virou e saiu do salão, sem mais cerimônia.
Senti todos ao meu lado respirarem aliviados, como se tivessem prendido a respiração todo esse tempo. Hm.
Estranho.
- Eu tentei avisar! Você teve sorte do Santo não te impor uma detenção! – disse para Devon, que continuava parado como uma estátua assustada.
Santo?
Não, não. Espera. Tom Riddle é O Santo?
HAHAHAHAHAHAHA.
Essa é boa.
Deixa eu te contar amiga, ele tá mais pra demônio em corpo de serpente.
Que coisa mais exorcista.
Tinha que ser coisa da . Que garota esquisita.
Devon xingou alguma coisa baixinho, e eu me levantei.
- AONDE... – começou ele, mas pareceu se lembrar da conversinha anterior - ... você pensa que vai? – terminou, agora num tom mais baixo.
- Ok, trés bien, o trato é esse: se você se comportar como um bom menino, te entrego a varinha depois do treino. Senão... ah, sei lá, senão eu penso em alguma outra coisa pra fazer com ela. Até mais!
E com isso, saí do salão, com nos meus calcanhares.
De alguma forma que foge de minha compreensão, às quatro horas, depois que as aulas haviam acabado, eu me vi sentada na arquibancada de frente para o campo, com do meu lado. Resolvi que ia entregar a varinha a Devon, porque não estava querendo muito acordar com o pé no lugar da cabeça, ou algo do tipo.
E agora eu seria obrigada a assistir um chato treino de Quadribol.
Espero pelo menos que o resto do time seja formado por garotos tão fisicamente desenvolvidos quanto o inferninho loiro ambulante. Aí pode até valer a pena. Muito.
- VAI, SONSERINA! VAI, SONSERINA! – gritava ao meu lado, junto com algumas garotas que também assistiam ao treino.
Olhei para o campo e notei que os cobrinhas estavam entrando, com aquele uniforme verde brega de doer. Pude facilmente localizar Devon, que era certamente o mais alto de todos.
Hmmm. Quando aqueles braços não estavam ameaçando me transformar em palito de dente, até que eram bem legais de olhar.
- , menos. É só um treino – resmunguei, me irritando ao vê-la pular de um lado pro outro gritando "Vai, Sonserina!".
- Eles precisam de incentivo, K! Participe também! – exclamava a . Nossa. Ela estava mais do que nunca parecendo uma cheerleader loira e burra – VAI, SONSERINA! VAI, SONS...
- ! – grunhi, puxando a saia dela para baixo para que ela se sentasse e agisse como uma pessoa normal – Quero te perguntar uma coisa.
Os olhos castanhos dela brilharam. Ela adorava ser útil.
Porque tipo, ela era quase inútil.
Tá, eu exagerei.
- Pode perguntar!
- Bem, hm... é só que... hã – eu tentava pensar em alguma forma de puxar aquele assunto de uma forma que não me comprometesse – Porque é que todo mundo ficou tão... você sabe, aterrorizado quando Riddle entrou no salão?
fez uma cara de "ahhhh".
- O Santo? Ah, bem, é uma longa história...
- Aliás! "Santo"? Sério, "Santo"?
riu.
- Ah, eu e algumas meninas que o chamamos assim! Porque ele está sempre na biblioteca, vigiando os corredores ou fazendo alguma tarefa extra... sem contar que nunca fica de namorico com ninguém! Acredite, algumas realmente tentaram, mas depois do quarto ano acho que todas desistiram, já que nunca se obtinha sucesso algum... – tagarelava ela.
Há. "Santo". Meu apelido então agora é Miss Simpatia.
E ela falou a palavra nada vocabular “namorico”?
- Mas por que todo o desespero quando ele deu as caras pelo salão? – perguntei, novamente.
endireitou a postura, como quem se preparava para contar uma história importante – e longa, temi.
- Bem, na verdade, é meio curioso. É que no primeiro ano, alguns garotos... inclusive Devon! Caçoavam dele por ser... mestiço – começou Pâmela, sussurrando ao dizer 'mestiço', como se estivesse dizendo algo, sei lá, proibido – Dizendo que ele não podia ficar na Sonserina, que ele estava sujando o nome da casa, que não era digno... você sabe, é mesmo meio estranho ele ter entrado na Sonserina mesmo não sendo puro-sangue, característica marcante de nossa casa.
Ah, bem. Talvez o fato de que o sangue do próprio Salazar-Lorde-também-maléfico corre nas veias 'mestiças' dele explique muita coisa.
E o fato dele ser o demônio em pessoa, é claro.
- Aham... – fiz, para que ela continuasse.
- Enfim, um horror! Eu juro que sentia pena às vezes do pobre coitado... sempre tão quieto, solitário, e as pessoas implicando! Até que... – ela fez uma pausa dramática – Até que um dia ele se encheu, creio eu.
olhou para os lados antes de prosseguir. Talvez pra verificar se ele não estava atrás dela ouvindo tudo, mas eu acho que era só pra dramatizar ainda mais.
Talvez ela queira ser narradora de algum livro os filme de suspense.
- Um dia, ele estava num canto do Salão Comunal terminando uma redação que o prof. Lestrade havia pedido. Foi uma das tarefas mais difíceis, e valeria como crédito para os futuros NOM's. Era pra fazer uma dissertação de quinze páginas sobre... ah, bem, não lembro. Mas era grande. E difícil! Quase ninguém conseguiu fazer, ou sequer tentou. Então, ele estava lá finalizando a redação, depois de ter ficado o dia inteiro sentado ali escrevendo... quando Yosh e Keppard apareceram e lançaram um feitiço nos pergaminhos usados por Riddle que fez com que se desintegrassem por inteiro. Não sobrou nada, nem um pedacinho! Eu fiquei com o coração apertado, até! Riddle não fez nada na hora, ficou apenas sentado olhando para os dois, que riam de chorar. E foi aí que...
Ela foi interrompida por gritinhos histéricos femininos que vinham da torcida. Devon acabara de fazer um gol.
- Que...? – perguntei, curiosa.
- Que os dois caíram no chão, agonizando de dor – Pâmela se aproximou, baixando o tom de voz – Ele havia lançado uma Cruciatus neles. Através de feitiço não-verbal. No primeiro ano.
Epa, epa, epa.
Não, não. Espera. Isso não tá certo.
Isso não pode estar certo.
Minha nossa senhora de bicicletinha. Como ALGUÉM (seja ser humano ou ET) espera que eu vença... isso?
- O QUÊ? – exclamei, com uma voz fina, em choque – Mas... mas como ele não foi expulso ou algo assim? Quero dizer, olá, ele usou uma maldição imperdoável!
- Na hora foi um choque total! O Salão Comunal estava lotado e ninguém sabia o que fazer, nem o que havia acontecido direito! O Monitor Chefe da época saiu correndo para avisar Slughorn, que levou os dois à enfermaria, e Riddle à sala do diretor. Não sei o que aconteceu por lá, só sei que Riddle voltou apenas com uma detenção. Acho não o puniram mais porque ele não devia saber o que estava fazendo... deve ter lido em algum lugar e... bem, não sei. Yosh e Keppard mal se lembram do que aconteceu. Mas depois disso, ninguém mais mexeu com ele. E aí depois ele virou o aluno exemplar e isso que você já conhece, o que dá mais medo ainda, porque ninguém sabe o que mais ele pode fazer hoje em dia, se com onze anos lançava Maldições Imperdoáveis por feitiços não-verbais! – precisou inspirar fundo, para recuperar todo o ar que perdeu enquanto falava tudo aquilo.
A única coisa que tenho a dizer sobre tudo isso é:
Já era.
- Uau. Quero dizer... caraca. Eu sabia que ele era imbecil e estranho e tudo mais... mas essa é novidade.
- É! E você dividindo o quarto com ele... admiro sua coragem, K! Acho que eu não conseguiria.
Engoli em seco. Bem, qualquer fiapo de coragem que eu tinha até agora com certeza já tinha voado por aí. Quero dizer, alô!
Eu estou enfrentando o Lúcifer em pessoa. Depois dessa, ele faz a Samara de O Chamado parecer uma criancinha mimada que talvez precise pentear o cabelo com mais frequência e tomar banho em água limpa.
Se ele descobrir, mesmo que remotamente, o meu plano...
Não gosto nem de pensar.
Certo, isso pelo menos serviu para alguma coisa. Serviu para:
a) Arrepiar até o último fio do meu cabelo;
b) Me fazer perceber que preciso mudar de estratégia. Abordá-lo e atacá-lo certamente não vai funcionar;
c) Me fazer sentir que evolui pelo menos um pouquinho – puxa, eram novas informações, não eram?
d) Me fazer pensar em contratar um guarda-costas para vigiar meu quarto. Estou pensando se Chuck Norris estaria disponível.
Acho que percebeu meu estado de transe, pois perguntou:
- Kate? Você está bem?
- Hã? Ah, oui – respondi, tão atordoada que nem percebi a língua em que estava falando.
Novamente houve um urro de gritos femininos. O treino havia terminado e elas estavam aplaudindo a performance dos jogadores.
Eu não deixava de sentir uma pontada de inveja delas. Quero dizer, olhe só! Todas acéfalas e preocupadas apenas com qual será o jogador que dará um mole para elas darem uns amassos.
E puxa, eu já tenho como dever e missão de, matar, enterrar e não precisamente fazer uma missa do Tom Voldy Riddle, futuro demônio em estado adulto e altamente perigoso.
- Bem, acabou o treino. Vem, vou te levar ao vestiário para você devolver a varinha ao Dev! – falou , me puxando pela mão, já que eu parecia incapaz de me levantar sozinha.
Devon. Uau. Por um momento havia esquecido que ele era um problema.
Por acaso já mencionei que acho hilário esse apelido do Devon.
Porque, pra mim, Dev é o nome de uma cantora super taradona...
Ah, esquece.
Segui a cabeleira loira escada abaixo, até atravessar o campo e chegar numa pequena instalação embaixo das arquibancadas, que deveria ser o vestiário.
- McNair, tá fazendo o quê aqui? – perguntou um dos jogadores, o que tava na porta, enquanto tirava a camisa.
- Olá Uriel, boa performance no treino!
Uriel ergueu as sobrancelhas, em uma expressão arrogante de "eu sei", e depois olhou pra mim.
- Olá gracinha, quer entrar no banho com a gente? – perguntou, depois dando uma risada exagerada.
Eca.
- Quem sabe depois – respondi, franzindo o cenho – Devon tá aí?
Ele revirou os olhos, como se fosse comum garotas irem ao vestiário procurando Devon, e depois berrou:
- DEV, TEM GENTE TE PROCURANDO – depois, voltou pra mim – Se quiser, o convite ainda tá de pé – e deu uma piscadela, depois dando a risada exagerada de novo.
- Não liga, é assim mesmo – disse . Logo depois, Devon surgiu à porta, apenas com uma toalha enrolada na cintura.
Merlin. Quantos, quantos músculos! Ele estava parecendo o próprio Adonis ali, com o cabelo loiro desgrenhado, o rosto vermelho devido ao jogo, e com aquele abdômem sobrehumano exibido.
- Devolve! – rosnou ele, fazendo com que eu desviasse os olhos do corpo de Deus Grego dele.
Querendo não demorar muito, abri logo minha mochila e tirei a varinha, que ele imediatamente arrancou da minha mão.
- Que nunca mais se repita, me entendeu, Beauxbatons? Ou não vou perdoar tão rapida...
Mas antes dele terminar, já tinha me virado e saído andando.
Quero dizer, tenho mais com o quê me preocupar.
Como com certos psicopatas medonhos que, vejam só, divide um aposento comigo.
E com como impedir que ele se torne o pior bruxo que essa sociedade já conheceu.
Isso tentando não perder muitas partes do corpo.
Ou seja, nada muito fácil.
Ai, Merlin.

Capítulo 9 – The Thin Line Between Tom and Kate.
Me afundei ainda mais na confortável poltrona de couro onde eu estava sentada, enquanto bocejava, olhando para a menina de cabelos loiros frisados que estava sentada no chão, à minha frente.
- Então, aquele problema dos pentelhos do primeiro ano que faziam visitinhas noturnas e barulhentas à cozinha foi resolvido? – perguntei à monitora do quinto ano da Corvinal, Cassandra Boyle.
- Sim! Mudei a senha da entrada para a cozinha, como você sugeriu – explicou ela para moi, os outros vinte monitores e Tom Riddle – Eles realmente têm que coçar a pêra da pintura para entrar! Os pestinhas nunca irão descobrir essa.
É. E eu vou poder voltar a atacar a cozinha e bater um papo com Felix à noite sossegada.

Mhuhauhua.
Riddle, logo após Cassandra terminar de falar, virou seus olhos congelantes em minha direção, perguntando em um tom curioso e zombeteiro ao mesmo tempo:
- Você realmente pensou nisso sozinha, Schiffer? – ele estava sentado em uma cadeira idêntica à minha, só que a dele ficava no outro extremo da sala.
Revirei os olhos.
- Não, não. Normalmente eu contrato um elfo para pensar por mim – respondi, carrancuda, arrancando algumas risadas abafadas dos monitores, que, misteriosamente, não pareciam ter tanto medo de Riddle quando estavam em minha presença – Eeeee acho que é isso aí, monitores. Estarei aqui se tiverem alguma dúvida ou comentário.
- Nós – Riddle mandou, sua voz inicialmente irrisória agora repentinamente quieta.
Suspirei irritada.
- "Nós" estaremos aqui se tiverem alguma dúvida ou comentário.
Rapidamente notei o monitor do sexto ano da Grifinória, Dawan Knox e sua colega também grifinória Vivienne Finch trocarem algum tipo de comunicação por olhares com os outros monitores, antes de Dawan erguer a mão de seu lugar no chão, com suas costas apoiadas no sofá da frente.
Dawan lançou um olhar rápido ao Monitor Chefe, antes de se voltar para mim.
- Kate, nós temos uma sugestão para nossa atividade.
Juro que de cara nem percebi aonde aquela conversa estava indo. Juro. Fui pega num momento de fraqueza.
Eu achei que por 'atividade', ele estivesse se referindo às monitorias ou sei lá.
Eu estava errada. Muito errada.
Como sempre.
- Sim?
- A... bem, a opinião popular está se inclinando para uma decoração mais... "calorosa", para entrar em contraste com o inverno que está chegando, ao invés da idéia inicial de uma decoração estilo "Era do Gelo", como você disse.
Foi quando eu senti o olhar de Riddle praticamente dando um tiro nas minhas costas que eu me liguei que a conversa não estava tomando um caminho muito legal.
Mas aí já era tarde demais. Porque os monitores deviam ter sentido que não havia, bem... perigo, devido ao meu alarme falso, e o assunto iria tomar força.
Merlin. Merlin. Merlin.
Ok. Fique fria. Tente acabar logo com o assunto antes que Riddle perceba do que se trata.
- Sim, sim, sim, parece ótimo Daw, depois me passe mais informações sobre isso e elaboraremos tudo – falei, me endireitando na cadeira, tentando fazer um tom frio e profissional, mas que saiu estranho e esganiçado.
Ótimo! Agora estou parecendo uma galinha esgoelada.
Achei que minha resposta iria satisfazer. Mas não satisfez.
- Me diga que informações que eu as consigo agora! – disse Dawan.
- Hã... você sabe – comecei, sentindo que ia começar a suar a qualquer momento – Isso e aquilo...
Droga. Sou uma fracassada. Minha capacidade de pensar direito sob pressão estava diminuindo cada vez mais.
Talvez fossem as cervejas amanteigadas que eu vinha bebendo toda noite.
- A gente estava esperando – foi a vez de uma entusiástica Vivienne entrar na conversa, encorajada por vários acenos positivos das cabeças dos monitores – Que pudesse ter também algum tipo de... atração! Nada muito complicado, mas talvez conseguíssemos algo legal...
Não respondi. Estava ocupada demais ficando paralisada que nem uma completa panaca na minha cadeira, com os olhos arregalados. Pensando em como eu estava ferrada.
- Talvez algum tipo de música... – sugeriu um monitor da Lufa-Lufa, um baixinho que usava um óculos enorme e quadrado.
- E luzes coloridas, ao invés de brancas! – expressou Freesia Plummet, da Corvinal.
- Mas tudo bem elegante, é claro – observou Vivienne.
- E precisamos de flores por todos os lados!
- E visgo! (risada maléfica).
- E se a gente fizesse um feitiço para cair pétalas de flores do teto?
- Já que terá música, precisamos separar um espaço para dança!
- E tem que ter mais música lenta, para podermos...
- ESPERE AÍ.
Como um vulcão entrando em erupção, a voz anormalmente elevada de Tom Riddle silenciou todos os presentes.
Oh, Merlin.
Senti meu corpo começar a tremer. Cara, ele ia me matar. Ele ia me matar com certeza. Ia me lançar um Avada Kedrava ali mesmo, sem nem usar a varinha, que nem ele fez quando era um pivete de onze anos.
Afinal, eu tinha aprontado. Pode me processar, mas eu estava meio que planejando uma festa por baixo do nariz perfeito dele. Tive essa idéia há duas semanas atrás, quando eu estava no auge do meu pavor por Riddle – quando me contou aquela história maníaca -e percebi que me sentindo daquele jeito eu não iria a lugar nenhum, então eu precisava relaxar.
E qual o melhor modo de relaxar, senão dando uma festa?
Por isso, contei minha idéia aos monitores e à , que a adoraram de paixão. Decidimos que cada monitor poderia convidar dois amigos, e tudo deveria ser feito com descrição.
Não achei que ele fosse descobrir. Sério mesmo. Tudo bem que ele é um mestre Jedi de perceber coisas, mas eu sabia que ele cagava baldes para a vida social estudantil, portanto nunca iria prestar atenção nessas coisas.
E estava indo tudo perfeitamente bem. Até eu ter um ataque de mongolice e não impedir que o assunto surgisse na reunião dos monitores – na qual que ele estava presente – como havia acabado de acontecer.
Por isso que agora meu desespero era puro e genuíno. Quero dizer, meu pavor ainda estava em alta (mesmo que Riddle tenha quase desaparecido por essas duas semanas – o que me deixou um tantinho aliviada), e eu tinha acabado de dar a ele a perfeita oportunidade de acabar com a minha raça. Quero dizer, alô. Eu fiz o imperdoável: reunir um monte de gente para realizar algo sem que ele soubesse.
Mas eu tinha que agir com calma. Ele não ia me matar ali na frente de todos os monitores, afinal.
Eu acho.
- Está com algum problema, Riddle? – perguntei, tentando fazer uma voz calma.
Ele se virou furiosamente em minha direção, com um olhar que claramente dizia: Esteja certa de que irei falar com você mais tarde, depois se voltando para os monitores, que se encolhiam tanto com seu olhar que pareciam realmente ter diminuído de tamanho.
- O quê? – perguntou Riddle, voraz. Eu sabia que ter que agir tão não-sei-de-nada daquele jeito devia estar matando ele.
Entretanto, não sei por que, eu sentia que a vítima no final seria eu.
Dawan Knox, que era apanhador do time de quadribol da Grifinória – e um dos únicos que não eram patologicamente amedrontados por Riddle, perguntou:
- "O que", o quê?
- Talvez você pudesse começar com "nossa atividade" e partir daí – disse Riddle, devagar e articuladamente. Mas eu sabia que todo mundo da sala podia sentir a irritação que pingava de sua voz.
- Ué, quer dizer que você não ficou sabendo da festa, Riddle? – ele perguntou, incrédulo.
Meus temores aumentaram ao perceber que o aborrecimento de Riddle tinha rapidamente se transformado em ódio fumegante. Eu sabia o exato momento da transição porque seu tom tomou aquele jeito mortalmente calmo e excessivamente composto, como se estivesse lutando para manter seus nervos em xeque, enquanto cuidadosamente dizia:
- Eu deveria ter 'ficado sabendo', Knox?
Dawan deu de ombros e virou-se para mim, como quem dizia: ué, ela sabia.
- Você sabia disso? – ele perguntou, praticamente espumando.
Me encolhi na cadeira. Droga.
Droga. Droga. Droga. Droga. Droga. Droga. Droga. Droga.
- Eu, hã... a sabedoria pode ser complicada – falei, num tom quase inaudível.
- Se ela sabia? Ela que começou tudo! – ouvi alguém dizer. Olhei para frente e vi Glade Green, monitor do sétimo ano da Sonserina, que por acaso também era o maior sacana.
Puxa, valeu Glade. Valeu mesmo.
Meu coração parecia estar na garganta, e eu tinha dificuldade para engolir.
Riddle se levantou.
- Esta reunião foi adiada – disse, com tom autoritário.
Só esse tom foi capaz de me fazer tremer mais ainda. Os monitores se entreolhavam com cara de "oh, oh", e levantavam-se de seus lugares para poderem sair. Um a um eles iam se erguendo e indo em direção a porta. Me levantei também para abrir a passagem para eles, tentando adiar ao máximo o momento que teria que ficar sozinha com Riddle.
Eles passavam e se acumulavam do lado de fora. Assim que último passou, Riddle surgiu logo atrás, rangendo:
- Precisamos conversar, Schiffer. Agora.
- Por que não fala aqui? Com testemunhas.
Ele ignorou, passando por mim e fechando a porta, fazendo aquele 'creek' irritante que ela sempre fazia.
Então era isso. Esta era a minha hora. Eu estava ali, completamente sozinha, com ele. Minha mente começou a desesperadamente procurar pela melhor maneira de passar pelo buraco do retrato antes que ele me lançasse uma maldição ou coisa pior; ou talvez como chamar alguém por socorro...
Meus pensamentos frenéticos foram interrompidos pelas batidas do meu coração, que tenho certeza que ecoavam na sala inteira.
Meu olhar o acompanhava enquanto ele atravessava a sala, finalmente parando em frente à lareira, com sua postura rígida, que indicava que ele estava tudo, menos calmo, ponderado e composto, como queria aparentar.
- Há quanto tempo isso tem se arrastado sem meu conhecimento? – ele perguntou, os olhos refletindo medonhamente as chamas da lareira.
Voz fria. Mortal.
Encomendem o meu caixão. E de preferencia um azulzinho turquesa.
- Bem... – comecei, tentando fazer com que meu coração parasse de bater tão alto – Eu tive a idéia há umas duas semanas.
Quando a mandíbula de Riddle se apertou, desviei o olhar e disse:
- E agora que você já sabe, Riddle, por que não vem, hã... dar uma conferida? – achei que estava indo por um caminho seguro. Quero dizer, sei lá, não tinha muito o que fazer, então por que não convidá-lo? Às vezes ele se sentiria tão grato pelo convite que me perdoaria pela história toda – As pessoas parecem realmente se divertir em festas, e, pelo que percebo, este é um conceito um pouquinho inexistente na sua vi...
- O ponto NÃO é ESSE, Schiffer! – Riddle gritou abruptamente, suas palavras ecoando no salão, mais alto até do que as batidas do meu coração.
Oh, Merlin.
Instintivamente eu agarrei a almofada da poltrona que estava na minha frente, desejando poder desaparecer dali enquanto o jovem Lord Voldemort perdia a calma pela primeira vez desde que eu o havia conhecido.
Bem, pelo menos na minha frente.
- O ponto não é esse – repetiu Riddle numa voz mais calma, como se estivesse fisicamente sugando as emoções de volta para dentro – O ponto é que, só porque eu sou maldito mestiço não quer dizer que eu não tenha os exatos mesmos direitos que você de saber o que está acontecendo nesta escola!
Hã?
Não. Sério. O quê?
Certo. Ele pode me acusar de tudo, menos de preconceituosa. Quero dizer, qual é! Não sei se deu pra perceber, mas apesar de agora eu estar usando esse sobrenome que aparentemente é de uma família puro sangue, eu sou absoluta e completamente o que as más linguas chamam de sangue ruim.
Isso mesmo. Minha família toda é inteiramente trouxa, sendo eu a única bruxa. Por isso minhas referências culturais são tão... bem, trouxas. Por isso que eu entrei para a Armée (pra proteger outros como eu, totalmente ameaçados por Voldemort). Por isso que eu odeio tanto esse babaca que dizimou mais da metade da população de nascidos trouxa do futuro.
E ele ainda tem a audácia de ME acusar de preconceituosa! Seu cínico de meia tigela, não sou eu que vou acabar com a raça dos nascidos trouxa daqui a alguns anos, não é mesmo?
- Mon dieu! "Só porque você é mestiço"? – ecoei, encarando-o incrédula. Até porque, além do mais, o que aquilo tinha a ver com qualquer coisa? – Você acha que é por isso que eu não te falei nada?
Os olhos de Riddle continuaram tempestuosos, mas suas sobrancelhas se ergueram levemente, como se a minha resposta não fosse o que ele esperava. Abruptamente, ele desviou o olhar do meu.
- E não é? – ele perguntou, finalmente, frio.
- Não! – exclamei, num tom de leve repulsa, para expressar o quanto eu estava achando essa idéia ridícula – Quando eu dei alguma indicação que eu ligava se você era ou não sangue puro? Bem, se de algum modo você acha que eu ligo, tenho novidades: eu NÃO ligo!
Mal podia acreditar o quanto aquela discussão tinha seguido um rumo diferente do que eu imaginava. Riddle balançou a cabeça, e com o maxilar cerrado, grunhiu:
- Bem, mesmo que não seja – o volume de sua voz aumentou significantemente, e dava para perceber que ele estava lutando consigo mesmo para se controlar – Droga, Schiffer, eu sou o maldito Monitor Chefe!
- E eu sou a Monitora Júnior! – exclamei, depois percebendo que fora um argumento ridículo, quero dizer, Monitora Júnior, linda bosta – E talvez eu tivesse te contado, se você não tivesse fugido de mim desde que organizamos os horários das monitorias há quase um mês atrás!
- Fugido de você? – Riddle repetiu, voltando sua face para a lareira – Isso é absolutamente ridículo, Schiffer. Nós temos as mesmas aulas, os mesmos compromissos de monitoria e o mesmo aposento. Como exatamente, como foi tão refinadamente colocado, eu estaria 'fugindo' de você?
Rolei os olhos.
- Por favor, Riddle, se vamos discutir, pelo menos sejamos sinceros! Talvez você não tenha se visto muito ultimamente, eu certamente não tenho, mas se eu fosse obrigada a chutar, eu diria que você estava com medo! – cruzei os braços e encarei seu perfil perfeito ilumidado pelas chamas.
- Com medo? – ele repetiu desdenhosamente, se virando para mim. Depois, uma risada gelada passou pelos seus lábios. Era uma risada tão fria e sem humor que me arrepiou até o último fio de cabelo – Com medo, Schiffer? Com medo de quê? De você?
Meus joelhos começaram a tremer.
- Não de mim – balbuciei, me apoiando na poltrona para que eu não desabasse ali mesmo – Mas do que eu posso fazer.
Dei um passo para frente (o que foi a coisa mais difícil que eu já fiz, se você quer saber, com minha perna tremendo daquele jeito).
- Você tem medo que eu toque em você e veja algo que você não quer que ninguém veja!
Alguma coisa ilegível passou pelos olhos de Riddle, mas foi logo substituído pelo ódio fumegante que estava ali antes.
-Schiffer, por favor, só porque você afirma ser algum tipo de vidente não é razão para eu ter medo de você – ele franziu o cenho, obscurecendo ainda mais suas feições – Ou de qualquer outra pessoa.
- Se você não está com medo, Riddle, por que não me deixa descobrir?
Riddle deu um passo para trás, saindo da luz das chamas e desaparecendo na escuridão. Só conseguia ver um vulto.
- Por que você tem tanto interesse em 'ver' partes da minha vida, Schiffer?
- Bem, primeiro você me acusa de estúpida, depois de superficial e agora de preconceituosa. Acho que a pergunta certa seria por que você tem tanto interesse em fazer piada da minha.
Em resposta, ele girou para me encarar, com um olhar tão abrasador que eu realmente senti que ia desmaiar.
- Você realmente não sabe de nada, Schiffer, você percebe isso? Você não sabe. Você veio de onde quer que seja e imediatamente assumiu que eu sou algum tipo de trapo simplesmente porque não aprecio manter a incessante e animada conversinha que você e seus amigos parecem gostar tanto.
Chiei em indignação. Ele simplesmente não estava falando nada com nada!
Nunca imaginei que Lord Voldemort pudesse ser um cara tão cheio de dores de cotovelo.
- Você só pode estar tirando uma com a minha cara! – exclamei, o que fez com que ele franzisse o cenho um pouquinho, quero dizer, aquela expressão certamente não era muito usada nos anos 40 – Eu assumi que você fosse um trapo? Há! Engraçado Riddle, realmente engraçado. Hm, talvez eu esteja errada, mas eu acho que quem é o rei de assumir coisas de todo mundo por aqui é você.
Ele abriu a boca para retrucar, mas eu – já completamente fora dos eixos – continuei:
- Quero dizer, ALÔ! "Oi, sou Tom Riddle, não me toque porque sou perfeito demais". "Oi, sou Tom Riddle, você está atrasada, você é um pé no meu saco, você não merece minha atenção porque é estúpida" – não satisfeita, prossegui – "Oi, sou Tom Riddle e não tenho amigos porque ninguém é bom o suficiente para mim".
Parei para respirar e olhei para ele.
Uau. Ele tava PUTO.
- Vou te contar, a vida com você não é nenhum piquenique, mas pelo menos eu me esforço para tentar alguma aproximação amigável! Você trata todo mundo como capacho e depois reclama que as pessoas se afastam de você, e bota a culpa no fato de ser mestiço! Cresce!
Merlin. Eu tinha acabado de mandar Tom Riddle crescer?
Eu era uma garota morta. E muito morta.
Suas feições tinham escurecido visivelmente, e ele ofegava de tanta raiva. Seus lábios estavam crispados e seu maxilar atarrachado. Eu nunca tinha visto ele aparentar tanta irritação. Quero dizer, na maioria das vezes ele esconde com perfeição, mas dessa vez o ódio devia ser tanto que ele mal tentava disfarçar.
Mas, qual é, ele precisava ouvir algumas verdades. Faz parte da missão.
Bem, mais ou menos.
- Já que você é tão esperta, Schiffer, me responda isso: você já foi odiada? Já? – ele perguntou, com mais emoção na voz do que ele provavelmente queria - Você já foi renegada pelo seu próprio maldito pai, antes mesmo que ele te conhecesse? Você já foi amaldiçoada pela sua própria mãe, antes que pudesse ao menos engatinhar? Fale agora, Schiffer – ele continuou, furiosamente – Porque eu ficarei absolutamente encantado de ouvir sua opinião sobre isso.
Uau, pensei. E agora o quê? Ele vai se ajoelhar e começar a cantar "Behind Blue Eyes"?
Olhei para Riddle. Ele não estava com raiva. Ele estava lívido. E eu continuava parada, em completo choque.
Ele tinha mesmo acabado de dar esse monte de informação sobre a sua vida, assim, de graça?
Puxa, sou boa mesmo.
Com um estalo, Riddle também pareceu perceber o que ele tinha acabado de fazer e, sem dizer uma palavra, moveu-se de seu lugar, duramente desviando seu olhar do meu.
Passou por mim quase que selvagemente, me atropelando e praticamente arrancando meu ombro fora. Ao perceber que tinha me tocado, arregalou os olhos por um instante, mas ignorou e continuou andando, fazendo seu caminho para o buraco do retrato, e dando o fora dali antes que você pudesse dizer "idiota".

2 comentários:

  1. Caramba. Tô adorando. Sério mesmo.

    ResponderExcluir
  2. PERFEITA...~.~
    AMEI ESSA FIC!
    NADA MELHOR QUE UMA BOA DOSE DE TOM GOSTOZAO RIDDLE NA VEIA...
    ¬¬'
    ADOREI ELA...O JEITO MALUCO,SEM NOÇÃO, DIVERTIDA, MUITO LOUCA DA PERSONAGEM;
    PARABÉNS, EXISTE POUCAS HISTORIAS COMO ESSA...
    !!!$_$

    ResponderExcluir

Comentem com sabedoria ok leitores? Rsrs. Nós comentários, quero que vocês deem e mostrem a sua opinião, o quê achariam legal e talz, entendem? Bem, BOM COMENTÁRIO! Kkkkkk.